A
trágica história ocorrida na propriedade conhecida como Morro dos Ventos
Uivantes é narrada em retrospecto pela empregada Nelly ao Sr. Lockwood, que cai adoecido após enfrentar uma nevasca e vira o novo
inquilino da Granja da Cruz do Tordo, casa vizinha ao Morro. É por meio das lembranças de Nelly que ficamos conhecendo os
horrores vividos pelos Earnshaw e pelos Linton, os respectivos donos daquelas
terras em tempos passados, que tinham em comum um homem com sede de vingança:
Heathcliff.
O
Sr. Earnshaw tinha dois filhos, Hindley e Catherine, e, um dia, leva para casa
um garoto cigano que vagava solitário pelas ruas da cidade grande. Esse garoto chamado Heathcliff, que desde o primeiro instante inspira desconfiança em todos
na casa devido à sua pele morena e ao seu surgimento repentino, se torna irmão adotado e melhor amigo de
Catherine e desperta o ciúme e a inveja imediatos em Hindley. Com a morte
da mãe e depois do Earnshaw pai, Hindley, que já desprezava Heathcliff, assume
o controle do Morro e transforma a vida do outro em um verdadeiro inferno. No
entanto, é Catherine, ao se aproximar dos vizinhos Linton e provocar
Heathcliff, quem acaba por despertar o ódio há muito tempo aprisionado do
ex-melhor amigo. E, uma vez acordado, nada consegue aplacar a ira do vulcão.
Não
vou falar muito sobre a história porque é longa e os personagens mudam de
sobrenome várias vezes, pois a desgraça vai passando de uma geração para a
outra, o que acabaria por tornar esta resenha confusa. Só digo que muitos definem a trama
como uma das mais sangrentas histórias de amor, mas eu diria que é uma história
de obsessão e vingança. Porque pode até ser amor, mas é doentio.
Aliás,
quase todos os personagens do livro são detestáveis, mesquinhos, egoístas e
mentirosos. E muitos consideram Heathcliff um dos maiores vilões da literatura
ocidental. Particularmente, discordo. Ele é, sim, um sujeito com sede de
vingança que não hesita em humilhar e maltratar o próprio filho para atingir
seus objetivos, mas pelo menos seu ódio não é gratuito. Para mim, o personagem mais odioso de todos é Catherine.
Se ela não tivesse brincado com os sentimentos alheios só por capricho, a
destruição dos Earnshaw e dos Linton não teria começado.
De
qualquer forma, foi ótimo ter dado uma segunda chance ao livro (minha primeira
leitura foi lá nos anos 90, por obrigação, e, como qualquer coisa que se faça
desse jeito, foi mal feita e acabei detestando a história). Desta vez, apesar
de os personagens serem abomináveis, pude notar como são bem delineados e críveis, e deu
para perceber a qualidade da escrita de Emily Brontë em uma trama bem elaborada
que mostra a degradação humana e a ausência de moral para enaltecer uma suposta
história de amor.
Além
disso, agora consegui observar as semelhanças e diferenças entre as obras das
irmãs. Em todas há uma moça decidida que luta pelo que quer (embora isso às
vezes cause a ruína de si mesma e da família) - e, que me desculpe Jane Austen, mas
as personagens das irmãs Brontë são infinitamente mais feministas em suas
atitudes. É claro que não conseguem fugir dos casamentos, mas o que elas defendem,
especialmente a Jane Eyre da Charlotte
e a Helen da Anne, vai muito além
de poder escolher o pretendente e fazer críticas à futilidade da sociedade (o que já é
alguma coisa, mas enfim...).
Outra
característica que aparece na obra das três irmãs são personagens que xingam e
blasfemam a valer (e nessa, o Heathcliff
de Emily leva a medalha de ouro). Imagino que isso tenha dado mais
credibilidade à ideia de que os livros haviam sido escrito por homens. A
religiosidade é outra constante em ‘Jane Eyre’, ‘A inquilina de Wildfell Hall’
e ‘O morro dos ventos uivantes’ (páreo duro entre o Joseph de Emily e a Helen
de Anne). Dos três livros, apenas em ‘A Inquilina’ a presença do sobrenatural
não é marcante – o que, para mim, é um ponto positivo.
“Subiu
na cama e abriu a veneziana com violência, irrompendo, enquanto a destravava,
em uma incontrolável torrente de lágrimas.
-
Entre, entre! – soluçava o homem. – Cathy, entre. Ah, entre... uma única
vez! Ah! Querida, ouça-me nem que
seja só desta vez... Catherine,
finalmente!
O
espectro demonstrava o capricho habitual dos espectros; não deu sinal algum de
estar presente; mas a neve e o vento rodopiaram, descontrolados, alcançaram o
meu posto e apagaram a vela."
Resumindo,
‘O morro dos ventos uivantes’ é uma ótima história de vingança. Eu, como fã de
um acerto de contas, já fiquei imaginando como seria trazer essa trama para os
dias de hoje. Na minha versão ideal da adaptação, Park Chan-wook seria o
diretor, afinal, ninguém retrata uma vingancinha melhor do que os sul-coreanos,
né?
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigada pelo comentário!
Respondo todos por aqui mesmo, OK?
Pode demorar um pouquinho, mas não deixo de responder ;)