LIVRO: Tony & Susan
Comprei
esse livro baratinho numa promoção da Bienal. Não sabia nada sobre a
história, mas tinha lido uma resenha elogiosa a respeito, então levei o dito cujo pra casa e enfiei na estante e não pensei
mais nele. Confesso que meu desinteresse se devia à capa. Na minha cabeça, era
uma história de amor, cheia de trocas de cartas e lembranças do passado. A
vontade de ler o livro só surgiu quando divulgaram o trailer de "Animais Noturnos" e percebi
que eu havia me enganado totalmente – é um thriller dos bons!
Susan trabalha como professora de
inglês em meio período e, no tempo restante, encarna uma típica dona de casa de
classe média americana: arruma a bagunça dos três filhos, faz faxina, se
preocupa com o jantar, fala com o marido ao telefone. À noite, ela, que define
a si mesma como uma leitora voraz, senta para ler, e então seu ‘animal noturno’
vem à tona, e encontra reflexo em “Animais
Noturnos”, o primeiro romance escrito por seu ex-marido, Edward, de quem se separou há mais de vinte
anos.
Susan
e Edward formavam um casal de namoradinhos de infância, mas a união durou
pouco, já que, para realizar seu sonho de ser escritor, Edward não trabalhava,
vivia isolado e melancólico, enquanto Susan bancava todas as contas do lar e
abria mão de seus próprios sonhos... até que se cansou, e o acaso tratou de
colocar em seu caminho Arnold, o
vizinho médico que também enfrentava problemas em seu casamento com uma esposa
doente. Frustrada, Susan vê em Arnold uma promessa de futuro mais estável e
feliz, e não pensa duas vezes antes de romper duramente com Edward e se casar
com o novo príncipe encantado, que também se livra da mulher com muita rapidez
e conveniência.
Enfim...
mais de duas décadas após a separação, Edward ressurge na vida de Susan por
meio do manuscrito de seu primeiro romance, que ele envia à ex-esposa para que
ela leia e dê um parecer, já que era sua maior crítica. Intrigada, ela começa a
leitura, tentando adivinhar o que o ex pretendia com aquela jogada, com medo de
se deparar com um trabalho ruim e ter que decepcioná-lo mais uma vez ao dar sua
opinião.
No
entanto, Susan é fisgada logo nos primeiros capítulos pelo drama de Tony, um pai de família que viaja à
noite para uma casa de veraneio no Maine com a mulher e a filha. No caminho,
eles encontram três sujeitos nada amigáveis e uma desgraça acontece. Tony, o
único sobrevivente, passa os anos seguintes se remoendo sobre o passado,
imaginando o que poderia ter feito para mudar o desfecho da história, oscilando
entre a vontade de seguir em frente com sua vida e de matar sua sede de
vingança.
Alternando
entre o passado de Susan e Edward, a situação (nada boa) do casamento de Susan
e Arnold e os eventos de “Animais Noturnos”, Austin Wright consegue envolver o
leitor numa trama de suspense angustiante. Susan se identifica plenamente com
Tony, sofre da mesma passividade, repensa suas atitudes com relação ao marido
atual e ao ex, e, como o protagonista de história de lê, ela também ronda à
noite, sedenta por sangue.
A
questão é: será que Tony e Susan conseguirão aplacar sua raiva e viver em paz?
Será que conseguirão fazer as pazes com o passado e com si mesmos?
“A gente escreve porque o
mundo é uma confusão desconexa, que não se consegue entender, a menos que se
faça um mapa com as palavras. Nossos olhos estão turvos e a gente escreve para
colocar os óculos. Não, a gente escreve porque lê, escreve a fim de refazer
para uso próprio as histórias de nossa vida. A gente escreve porque nossa mente
é uma tagarelice sem sentido, a gente escava em busca de um caminho nessa
tagarelice, um caminho que nos leve de volta a nós mesmos. Não, a gente escreve
porque está enclausurado dentro do próprio crânio. A gente envia nossas sondas
para dentro do crânio de outras pessoas e espera alguma resposta.”
Nota:
4/5
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FILME: Animais Noturnos
Como
eu disse, peguei o livro para ler por causa do trailer do filme, que conta com Amy
Adams (Susan), Jake Gyllenhaal (Tony/Edward) e Michael
Shannon (policial Bobby Andes) no elenco. Ao contrário do livro, cuja
capa não revela muito da história, o trailer já deixa claro que se trata de uma
história tensa.
Susan em sua ronda noturna |
Uma
diferença fica evidente logo de cara: Susan e o novo esposo levam uma vida bem
mais glamorosa do que os personagens do livro, mas manter esse padrão de vida
é, para Susan, uma forma de pressão equivalente à monótona rotina da dona de
casa suburbana das páginas – não há filhos para criar nem trabalhos domésticos
a serem feitos aqui, mas Susan está igualmente frustrada nos campos afetivo e
profissional.
E preparando o ataque |
Quanto
aos problemas do relacionamento de Susan e Edward, são suavizados, quase que
totalmente limitados às diferenças de classes e interesses, escancaradas pela
mãe de Susan. E o Edward interpretado por Gyllenhaal até parece fofo com sua
pose de escritor romântico e sonhador, como se o fim do seu casamento com Susan
tivesse sido apenas culpa dela – o que não é verdade.
Jake sedutor como Edward |
De
qualquer forma, o filme consegue captar perfeitamente os dilemas de Tony e de
Susan, e o jogo de espelhamento desenvolvido no livro fica ainda mais óbvio na
tela, com a justaposição de imagens dos dois personagens em vários momentos (por exemplo, quando
vemos primeiro ele tomando banho e logo depois ela). O tom sombrio dos cenários
reflete plenamente o peso que ambos carregam no peito, o arrependimento, a
vontade de compensar a passividade com uma ação friamente calculada para dar o
troco. A trilha sonora incômoda colabora muito para mostrar os conflitos
internos dos personagens.
E perturbado tentando encerrar o caso ao lado de Bobby Andes |
Vale
destacar ainda o sempre incrível Michael Shannon, encarnando o
policial que ajuda Tony na investigação do crime que destruiu sua família e que
acredita em fazer justiça com as próprias mãos. Mais do que um desfecho para o
caso de Tony, o policial Bobby Andes
busca uma realização pessoal com a caçada que empreende aos criminosos. No
filme, a trama foi transferida do Maine para o Texas. Não conheço nenhum dos
dois estados, mas, se o primeiro nome evoca imediatamente Stephen King e estradas
vazias e aterradoramente escuras, o segundo me faz pensar em sujeitos durões
com chapéu de caubói e espingarda na mão e desertos cheios de cobras venenosas
– e nisso são igualmente assustadores.
Nota:
4/5
Quero muitooooo ler este livro.
ResponderExcluirNunca prestei muita atenção nesse livro, mas lendo sua resenha fiquei bem curiosa.
ResponderExcluirClaudia,
ResponderExcluirEu me enganei totalmente pela capa e foi uma ótima surpresa.
Lígia,
Ele não chama a atenção à primeira vista, né? Mas vale dar uma chance.