O LIVRO: UMA GARRAFA NO MAR DE GAZA
Um
homem-bomba explode em um café em Jerusalém e mata 6 pessoas. A notícia está em
toda parte. Tal, uma garota israelense de 17 anos, não sabe como reagir diante de mais
essa tragédia. Desesperada, ela escreve uma carta e pede ao irmão, que presta
serviço militar em Gaza, que lance uma garrafa com a mensagem ao mar. No
entanto, ao contrário do que esperava Tal, a carta enviada para um
destinatário desconhecido, que ela imaginava que seria uma garota, vai parar nas mãos do ácido
Gazaman. Como reagir quando seus planos não saem como esperado?
Tal Levine é uma adolescente como
qualquer outra, que sonha em ser cineasta ou pediatra e que divide seu tempo
entre a escola, os amigos, a família e o namorado. Ela poderia ser uma garota
de qualquer parte do mundo, mas mora em Jerusalém e, portanto, além das
preocupações típicas dos jovens de sua idade, tem que lidar com os frequentes
atentados e com o medo de morrer a qualquer momento, como vítima de um conflito
do qual discorda. Ao enviar sua mensagem angustiada a uma pessoa anônima do
outro lado da fronteira, ela esperava encontrar uma amiga que compartilhasse da
mesma indignação e desprezo pela guerra despropositada que separa israelenses e
palestinos há séculos. Ela queria entender por que não sabia quase nada sobre
as pessoas que vivem há apenas 100
km de distância, enquanto parece saber tudo sobre o modo
de vida dos americanos, que moram do outro lado do globo terrestre.
Só
que o acaso leva a mensagem diretamente para as mãos do Gazaman (cujo nome real é Naim),
um jovem palestino um pouco mais velho que Tal que ri das dúvidas da garota, a
critica por generalizar as pessoas e achar que todo palestino é ruim, por supor
que seria entendida ao escrever uma carta em hebraico. Ele demora até responder
as investidas dela, zomba de sua inocência, faz comentários maldosos. Para ele,
não há possibilidade alguma de um futuro de melhor. Os inúmeros acordos e
promessas de paz não cumpridos o transformaram em uma pessoa desiludida e
amarga. Tudo o que ele vê é pobreza e devastação ao seu redor; tudo o que
deseja é matar israelenses, fazê-los sofrer, ter uma terra natal para chamar de
sua, sem fronteiras com guardas armados, sem arames farpados.
Todavia,
Tal pode até ser ingênua, mas é também persistente e otimista. Mesmo diante do
escárnio de Gazaman, ela não desiste de tentar estabelecer o diálogo, de
entender o que se passa do outro lado, de procurar enxergar as coisas de uma
perspectiva diferente. E ele, apesar de ridicularizar a garota na maior parte
do tempo, admite que os questionamentos dela têm seu valor, percebe que ele
também generaliza as coisas, reconhece que a admira pela sinceridade e
obstinação. Aos poucos, uma improvável amizade se desenvolve. Mais que isso
até: uma vontade genuína de se conhecer pessoalmente, de ter aquela outra
pessoa ao seu lado. Nasce um amor impossível.
Como
acontece às vezes, me pego presa involuntariamente a uma temática. Tudo começou
quando li “Vidas Provisórias”, que
falava sobre a sensação de não-pertencimento de se viver em um país
estrangeiro, e depois fui conferir “A Máquina de Fazer Espanhóis”, que tratava de solidão. Querendo ler algo mais
“simples”, decidi ler “Persépolis”
(a simplicidade está somente na forma - uma HQ - não no tema), mais uma
história sobre isolamento, e, por fim, peguei para ler "Uma Garrafa no Mar de Gaza", outro livro que fala das
dificuldades de sentir-se só, deslocado e longe de quem se ama.
Embora
a trama de um casal apaixonado que não pode ficar junto não seja uma coisa
inédita, gostei muito da forma como a história se desenrola, por meio de
e-mails trocados entre Tal e Gazaman. O fato de o cenário ser uma região de
conflito do Oriente Médio foi mais um ponto positivo, pois, como eu já disse
aqui, não sei quase nada sobre o que se passa lá, só o que tenho são
informações superficiais e confusas que encontro na TV e em jornais. Achei bem
interessante ver as coisas pela ótica de quem vivencia essa realidade, ter um
pouco mais de dados históricos. Ah... o final aberto possibilita diversas
interpretações, o que para mim é mais uma qualidade.
“Não, não, não, tudo isso é
impossível porque não é lógico, porque não pode acontecer no mundo real. No
mundo real, não posso ir bater na porta de Tal Levine, mesmo que tenha seu
endereço, não posso dizer a ela: ‘Oi, sou eu, fiquei com vontade de conhecer
você de verdade, você gostaria de tomar um café comigo?’. No mundo real, só
pode haver eu de um lado, ela do outro, nossos dois povos se odeiam e se
disputam, somos o Romeu e a Julieta do terceiro milênio, mas não há ninguém
para escrever nossa história”.
Romance
com fundo histórico e político. Bonito, gostoso e rápido de ler.
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O FILME: UMA GARRAFA NO MAR DE GAZA
Em
linhas gerais, o filme é fiel ao livro. Algumas adaptações foram feitas para
causar mais impacto nas telas, como, por exemplo, a garrafa que é jogada ao mar
e é encontrada por um grupo de rapazes na praia. No livro, a garrafa é
enterrada na areia pelo irmão de Tal, pois se ele se aproximasse do mar ou
alguém o visse jogando coisas na água, poderia arranjar problemas. Sem dúvida
alguma, a imagem da garrafa flutuando e chegando ao seu destino é muito mais
bonita e poética.
No
entanto, algumas adaptações me desagradaram. Como o fato de Tal e Gazaman se
comunicarem em inglês. Além de não fazer sentido no filme, já que é uma
produção da França e os personagens em certo momento frequentam centro de língua
e cultura francesas, a troca do idioma de comunicação faz com que a discussão
histórica sobre domínio de culturas na disputa de territórios perca sua força.
Tal
tem nacionalidade francesa no filme, enquanto no livro ela é uma israelense que
tem orgulho de ter nascido em Tel Aviv. Não que isso diminua a qualidade do
filme, já que a própria Valérie Zenatti, autora do livro, é uma francesa que
passou a adolescência toda em Israel e também ajudou a adaptar sua obra para as
telas. São detalhes que não afetam a história e que provavelmente passariam
despercebidos se eu não tivesse assistido ao filme 1 dia depois de ter
terminado a leitura.
Especificidades à parte, o filme acerta ao focar no cotidiano dos protagonistas. Vê-los em ação
com certeza funciona muito melhor do que acompanhar a troca de mensagens entre
eles, um recurso que só dá bons resultados no livro. A mudança na estrutura familiar de
Naim dá maior carga dramática à história. Só não gostei de vê-lo mais educado.
O Gazaman pega muito mais pesado com Tal no livro. Em compensação, os amigos que ele ganha nas telas mantêm o nível de zombaria do texto escrito.
Assim
como no livro, é ótimo acompanhar o desenvolvimento da amizade, a mudança de
atitude dos protagonistas, a importância que um adquire para o outro. Uma
história bonita e comovente, sem ser piegas ou forçosamente romântica demais,
que fala de esperança, apesar de tudo.
Uma
ótima opção de filme para quem gosta de romance e quer fugir dos clichês.
Veredicto:
Leia
o livro e veja o filme!
Aqui tem o trailer para quem se interessar.
3 comentários:
Nossa Michelle, eu sou super curiosa com esse livro , porque adoro histórias que se passam no oriente médio ou ali nas regiões próximas.
Bom pelo menos a história parece ser interessante!
Agora sim anotei no meu caderninho de compras :)
abraços
Michelle como não li o livro, o filme funcionou super bem para mim. Gostei muito de como a história é conduzida. Principalmente porque a gente sabe que eles nunca poderiam ficar juntos ali, naquele lugar, mais ainda assim cria uma esperançazinha boba. E a cena final, sério, chorei muito. Linda aquela cena. O olhar dela traduz todo o absurdo daquela situação.
beijo grande,
Maira
Melissa,
Eu também fico curiosa com histórias que se passam no Oriente Médio. O contexto e as disputas não são tão fáceis de entender, mas eu continuo tentando ;)
Maira,
Eu gostei do filme, mas sabe como é... assistir imediatamente após a leitura faz a versão das telas perder um pouco a força. Mesmo assim, é lindo.
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