O
livro narra a história de Salomão,
elefante nascido em Goa e levado para Portugal no Século XVI e que, anos
depois, é oferecido pelo Rei Dom João III e sua esposa, Catarina D’Áustria, ao
arquiduque austríaco Maximiliano II, como presente de casamento. A inacreditável
viagem do paquiderme de Lisboa, em Portugal, a Viena, na Áustria, e todas as
dificuldades do trajeto é o que acompanhamos no livro.
Salomão
havia sido levado para Portugal para atender a caprichos de Dom João, que
precisava de algo excêntrico e vistoso para chamar a atenção dos súditos. De
fato, o gigantesco animal de 4 toneladas foi a atração da cidade durante um bom
tempo, mas, assim como ocorre com todas as novidades empolgantes, caiu no
esquecimento e passou a ser um estorvo. A oportunidade perfeita de se livrar do
problema e, de quebra, causar impacto junto ao povo austríaco, se deu na forma
do presente de casamento.
No
entanto, é lógico que enviar um animal desse porte mais todos os suprimentos de
que necessita em uma viagem de meses, que cruza vários países, não é uma tarefa
simples. Infelizmente, as falhas de logística e de planejamento só foram
percebidas quando a caravana já estava em curso, e incluíam desde a escolha
inadequada do período para o deslocamento (era uma época chuvosa de inverno)
até a organização dos componentes no comboio, passando por problemas
diplomáticos entre os países envolvidos na entrega do “presente” e um trecho do
trajeto que exigia o transporte por navio.
Embora
a história seja interessante, senti falta de um destaque maior ao elefante,
supostamente o protagonista da trama. Como em outros livros do Saramago, o
autor usa uma viagem apenas como pano de fundo para mostrar seu
descontentamento com os portugueses e com a humanidade como um todo, fazer
críticas à igreja e mostrar os males causados pela religião e falar sobre a
“lei da vida”. Tudo com aquele seu estilo peculiar de escrita, com texto
recheado de observações sobre a natureza humana e comentários ácidos.
O
interessante é que, por mais insólita que possa parecer a tal viagem, ela
ocorreu mesmo e gerou outro livro, posterior ao do Saramago, que trata do mesmo
tema: "Salomão - O Elefante Diplomata", de Jorge Nascimento Rodrigues e Tessaleno
Devezas. Na verdade, essa outra publicação também fala de outros animais
exóticos de grande porte usados por Portugal para melhorar sua imagem diante de
outros países europeus: Annone, um
elefante branco enviado por D. Manuel I ao Papa Leão X, em Roma, juntamente com
outros animais, e Ganda, o
rinoceronte oferecido também por D. Manuel I ao Papa Leão X, mas que não teve a
mesma sorte e que morreu no naufrágio do barco que o transportava. O
rinoceronte Ganda também inspirou "40 Rinocerontes", de Israel
Jorge, um livro de crônicas.
Como
se vê, não é de hoje que a humanidade tem mania de grandeza e excentricidades
estapafúrdias que terminam mal. E, apesar de acharmos que somos “seres
evoluídos e superiores”, séculos após séculos continuamos cometendo os mesmos
erros. Não sei quanto a vocês, mas eu não vejo muito progresso. Ainda bem que
pelo menos há (ou havia) pessoas como Saramago, para nos fazer rir de nossas
próprias desgraças.
"O que nos vale é o bom feitio dos elefantes, especialmente dos oriundos da índia. Pensam eles que é preciso ter muita paciência para aturar os seres humanos, inclusive quando nós os perseguimos e matamos para serrarmos ou arrancarmos os dentes por causa do marfim. Entre os elefantes recordam-se com frequência as famosas palavras pronunciadas por um dos seus profetas, aquelas que dizem, Perdoai-lhes, senhor, porque eles não sabem o que fazem".
"O que nos vale é o bom feitio dos elefantes, especialmente dos oriundos da índia. Pensam eles que é preciso ter muita paciência para aturar os seres humanos, inclusive quando nós os perseguimos e matamos para serrarmos ou arrancarmos os dentes por causa do marfim. Entre os elefantes recordam-se com frequência as famosas palavras pronunciadas por um dos seus profetas, aquelas que dizem, Perdoai-lhes, senhor, porque eles não sabem o que fazem".
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3 comentários:
Gosto muito do mestre José Saramago, mas por algum motivo, que eu ainda não descobri qual é, A Viagem do Elefante sempre foi o menos "interessante" (uso por falta de palavra melhor) para mim. Mas acredito que sendo do Saramago já vale a leitura, afinal nunca é o que a gente espera. Sempre tem um "quê" a mais que sempre o destacou.
Gostei muito da sua resenha e estou bastante feliz pelo DL ter me proporcionado conhecer esse espaço, que é tão bacana! Enfim, adorei! Beijos ^^
Obrigada, Taciele!
Também sempre considerei "A viagem do elefante" o menos interessante, mas achei que o tema de animais protagonistas do DL era o momento perfeito para conferir a história. De fato, não gostei tanto quanto de outros títulos, mas mesmo assim valeu a pena. As observações do Saramago sobre o comportamento humano são imbatíveis.
bjo
Este eu ainda não li, mas tudo que já li de Saramago até hoje me encantou. Ele é crítico, inteligente, diferente! Sou fã. Excelente dica!
www.universodosleitores.blogspot.com.br
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