“Rir
não é simplesmente um jeito vão de escapar das dolorosas questões da realidade:
é uma forma de celebrar que dificilmente há certeza maior do que a constatação
de que estamos rodeados de incertezas. Frente ao relativismo das coisas e às
angústias de que os portos seguros se movimentem junto com as ondas, rir é uma
forma de se libertar do sentido e de se apegar aos sentidos”.
Você
não está vendo coisas nem entrou no blog errado. Sim, fiz uma resenha de um
livro de autoajuda. Pior: a resenha de um livro de autoajuda que eu mesma pedi
e ganhei de aniversário. O que eu posso dizer? A minha admiração por Woody
Allen e minha curiosidade para conhecer o poder transformador de suas obras
venceram a racionalidade de nunca ler esse tipo de livro, que considero
uma forma simples e eficiente de tomar o dinheiro de pessoas desesperadas que, obviamente, não encontrarão fora de si mesmas a ajuda que buscam com tanto
fervor.
Mas
vamos lá! O autor, Éric Vartzbed,
faz uma breve análise de alguns filmes e livros de Woody Allen para mostrar como a forma peculiar de ver o mundo do
cineasta pode nos influenciar, nos fazer pensar e, por fim, nos transformar. Éric nos conta algumas de suas experiências pessoais e cria tópicos de ajuda a
partir de assuntos recorrentes nos trabalhos de Allen: amor, política,
psicanálise e religião.
O
autor também examina o fascínio que Allen exerce sobre seus fãs e a forte
identificação entre o público e os personagens criados por ele. Para tanto, Éric se vale da comparação entre mito e conto (as histórias de Allen se
encaixam nessa última categoria), contrapondo a figura do herói e suas
exigências inatingíveis à figura do anônimo, frequentemente interpretado pelo
próprio Allen - um homem simples, baixinho, desprovido de beleza, desajeitado,
neurótico, cheio de complexos, mas que não se deixa abater pelas dificuldades e
segue em frente, sempre em busca de seus sonhos. E, nessa jornada, ele
usa a arma mais eficaz para enfrentar os obstáculos: o humor. Esse é, portanto,
o segredo do sucesso desse nova-iorquino famoso e adorado no mundo todo.
“Em
1928, o cinema evolui: antes mudo, vira falado. Com Woody Allen, inaugura-se
outra etapa: antes falado, vira tagarela...”
Quem
já viu algum filme do diretor sabe que a frase acima é a mais pura verdade. Em
toda a obra do cineasta, a palavra se sobrepõe às imagens. Como mostrado no
livro, a profusão verbal de Allen é resultado direto de suas influências
cinematográficas: muitos filmes italianos e suecos que ele não apenas assistia,
mas também lia (nas legendas) quando jovem, o que o tornou ao mesmo tempo
espectador e leitor.
A
importância das palavras é exemplificada por Éric na descrição de uma cena de “Vicky Cristina Barcelona”, na qual a
impetuosa Maria Elena (personagem de
Penélope
Cruz) discute com seu marido (interpretado por Javier Bardem). A
discussão acalorada, em espanhol, a língua materna de ambos, esfria e fica mais
controlada quando o casal interage em inglês por causa da presença de Cristina (Scarlett Johansson), hospedada com eles. O distanciamento
provocado por uma língua estrangeira é capaz de aplacar a raiva do casal
explosivo e mostra a força do verbo.
No
geral, achei o livro bom, com algumas curiosidades sobre Allen e seus filmes. A
análise das obras, embora simples, serve ao propósito, que é extrair dicas para
tornar a vida dos leitores melhor. Essas dicas foram reveladoras? Não. São
capazes de transformar completamente minha perspectiva? Não. Vão me fazer mudar
de vida? Não. Mas reforçam a mensagem positiva dos trabalhos de Allen, de que
devemos buscar a felicidade da forma que estiver ao nosso alcance, sem receitas, cada um
encontrando seu próprio caminho.
Esta postagem também faz parte do Desafio Realmente Desafiante 2013 - Item 12: Ler um livro que você ganhou de presente de aniversário. Para ver a lista de obras selecionadas e outros posts do DRD2013, clique AQUI.
4 comentários:
Talvez voce tenha um pouco da Alice,
de Paris-Manhattan.
Também não aprecio auto-ajuda, mas acho que para alguns casos funcione. É como um empurrãozinho, um conselho. A pessoa tem que saber como tirar proveito.
Olha, eu tenho uma péssima memória, mas acho que vi esse filme, Vick, e lembro dessa cena!!! Incrível mesmo esse comportamento.
Acho q o livro funciona mais para reconhecemos o padrão Woddy Allen do que para ensinar algo incrível.
Adorei a resenha, Mi.
Beijos
Hahahaha eu leria também pelo velho e bom Woody! Adoro ele, é o tipo de diretor que conforta sem ser mentiroso. E sim, eu também adoro as esquisitices e neuroses dele :P
Beijos!
Herculano,
Ainda não consegui ver esse filme. Mas fiquei curiosa agora... será que é bom ser como essa "Alice"?
Flá,
Eu realmente não acredito que um conselho faça alguém mudar. Para mim, cada um sabe exatamente qual é o seu problema e o que tem que fazer para resolvê-lo. O difícil é fazer o que tem que ser feito, né?
Tati,
A parte da autoajuda eu dispenso, mas conhecer um pouco mais do Allen é sempre bom.
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