“Procura-se alguém que saiba turco”.
É
esse anúncio simples que leva a estudante turca Pelin até a casa da senhora Rosella
Galante, que fugira para Istambul durante a Segunda Guerra Mundial e que
agora, com uma idade avançada e já bem doente, quer encontrar alguém que a
ajude a praticar a língua turca para manter viva suas memórias.
Pelin
responde ao anúncio sem saber direito o que esperar. Ao chegar ao endereço
fornecido, em uma metrópole europeia, descobre que a senhora que o publicara queria apenas conversar
durante duas horas, uma vez por semana, em uma língua com a qual tem
ligação sentimental. A garota acha tudo muito estranho, se fecha, quer ir logo
embora. Mesmo duvidando que voltará àquela casa outra vez, diz que vai estudar
a proposta.
Mas
acaba aceitando. Como ela mesma reconhece, precisa de dinheiro. Além disso, o
trabalho é fácil. Basta sentar e escutar a senhora falar, dizer alguma coisa em resposta. Só que a
dona da casa não queria só contar suas memórias. Queria ouvir as histórias
daquela garota, conhecê-la melhor. Assim, o que começa como um jeito fácil de
descolar uma grana para Pelin e uma forma de não esquecer o passado para
Rosella, se transforma em um misto de sessão de terapia e trocas de
confidências entre amigas improváveis.
É
muito interessante notar como Rosella e Pelin são tão diferentes e ao mesmo
tempo tão parecidas. Enquanto a primeira é calma, sensata e romântica, a
segunda parece tensa, impulsiva e desacreditada do amor. Uma diferença de idade
de sessenta anos entre elas é o principal fator que explica comportamentos tão
opostos. Mas conforme elas vão se conhecendo melhor, vão notando similaridades
em suas histórias e estreitando laços.
Gostei muito da parte em que as duas
conversam sobre galãs do cinema
(Rosella menciona um ator que interpretara Tarzan em sua juventude e que Pelin
não conhece; logo elas passam a listar os bonitões em atividade: George
Clooney, Tom Cruise, Brad Pitt, Schwarzenegger), sobre música (Pelin aparece com uma camiseta do Placebo e Rosella,
enganada pela aparência andrógina do vocalista, elogia e beleza da ‘garota’ da
banda e pede para ouvir o CD, depois quer saber mais sobre Kurt Cobain; Pelin, por sua
vez, vira fã de Brahms) e principalmente sobre palavras e seus significados (Rosella fica encantada com os novos
termos e gírias que Pelin lhe apresenta e se empenha em usá-los nas conversas;
a garota aos poucos aprende a importância das palavras e como elas mantêm vivas
as lembranças e, consequentemente, aqueles a que se referem).
Além
disso, o livro trata do papel da memória e de como muitas vezes criamos
um passado, misturando acontecimentos com nossos desejos, ficcionalizando nossa
própria história para que seja perfeita. E é justamente essa realidade
inventada que não queremos perder quando nossa mente começa a falhar. Esquecer
é deixar de existir.
“Me
parece que a magia da vida está em como a contamos e não como a vivemos, minha
queria Pelin. Há vidas nas quais nenhuma folha se mexe, mas elas se tornam
histórias pela habilidade de quem as conta.”
Um
leitura rápida e delicada sobre o coração humano, seus mistérios e suas
histórias. Recomendo muito!
4 comentários:
Adorei a resenha e fiquei com vontade de ler o livro, parece interessante. Você escreve muito bem.
Não conhecia o livro e fiquei interessada. Gosto bastante de obras que mostram amizades inusitadas. :)
Linda resenha!
O livro parece delicioso, o tipo de história que me prende.
Vou procurar!
Beijo!
Renata,
Obrigada pelo elogio! Descobri esse livro por acaso e foi uma ótima surpresa. Se tiver a chance, leia sim!
Lígia,
Acho mesmo que você gostaria desse, viu?
Aline,
Delicioso descreve bem. Parecia que eu estava sentada com as duas, só ouvindo a conversa.
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