E
quase um ano depois do último post, estou aqui novamente, só para deixar
registrados alguns pontos que me chamaram a atenção durante a leitura de
“MaddAddão”, terceiro e último volume da série iniciada com “Oryx e Crake” e
que tem como segunda parte “O ano do dilúvio”, livros que li junto com a Lulu
para o nosso projeto Lendo Margaret Atwood. Enfim... li a última parte
da trilogia em agosto de 2019, mas muitas coisas me impediram de fazer uma
resenha. Já nem lembro dos detalhes da história, então vou só apontar alguns
assuntos abordados em alguns trechos que destaquei enquanto lia.
Como
nos demais volumes da série, a narrativa alterna entre a realidade do mundo
pós-pandemia e as condições e situações que levaram ao caos. A narradora
principal é Toby, uma das seguidoras dos Jardineiros de Deus que sobreviveu isolada no topo de um edifício. Neste livro ela reencontra algumas de
suas pupilas queridas e seu amado Zeb e, junto com outros personagens, formam um
grupo de sobreviventes que têm que enfrentar não apenas os desafios do novo
mundo, mas também fugir ou combater (dependendo do momento) outros
sobreviventes nada amigáveis: os criminosos painballers.
Zeb
também tem um papel importante neste volume, porque suas lembranças preenchem
as lacunas das histórias contadas nos livros anteriores e revelam de onde
surgiu o MaddAddão. Um personagem secundário que cresce no volume final da saga
é Barba Negra, o menino cracker que acompanha Toby constantemente e que quer
aprender a ler e a escrever, contrariando as intenções de seu criador. A
criança se destaca também por fazer as perguntas que levam às críticas da
autora aos assuntos abordados, principalmente à religião.
Enquanto
Toby conta aos crackers a origem e/ou o passado das coisas, ela vai criando
toda uma mitologia, apelando para conceitos sobrenaturais para explicar coisas
nem sempre simples de colocar em palavras e, assim, vemos uma religião e
divindades surgindo. É assim que Atwood questiona as crenças, que são criadas
por humanos, sempre com uma intenção por trás. Até que ponto isso nos ajuda a
seguir em frente? Quando isso se torna limitador do pensamento e das atitudes?
Outro
ponto interessante diz respeito aos crackers, a versão aperfeiçoada do Homo
sapiens: eles têm um mecanismo interno de cura, são dotados de repelente,
vivem em sintonia com o ambiente e com as outras espécies, têm senso de
coletividade, mas... seu criador foi um homem (aqui no sentido de indivíduo do
sexo masculino mesmo) e, como tal, as fêmeas da nova espécie têm a peculiar
característica de jamais dizerem não para o sexo, o que teria um papel
importante na harmonia da comunidade. Hum... interessante isso, não? O sonho
masculino realizado. Mais uma bela cutucada da Atwood, depois de já ter
abordado no volume anterior a inferiorização feminina até mesmo entre os
pacifistas Jardineiros do Céu (falei disso na resenha de “O ano do dilúvio”).
Outra
coisa com relação aos crackers: embora sejam a versão 2.0 dos seres humanos,
eles não possuem as características que nos distinguem como espécie (não vou
dizer superior porque não acho que sejamos): não são capazes de criar. Sua
integração ao ambiente e sua convivência com os outros seres são ideais, mas eles não possuem
imaginação. Mas quem sabe o pequeno Barba Negra seja aquele que levará à
mudança?
Embora
eu não possa mais fazer uma análise detalhada, digo que gostei da leitura na
época e que foi uma ótima experiência, como sempre.
“Existe
a história, e depois a verdadeira história, e depois a história de como a
história foi contada. E depois o que se deixou de fora da história. O que
também faz parte da história”.
Nota:
4/5
>> Lulu
publicou a resenha dela aqui. Miga, muito obrigada, mais uma vez!
Esta resenha faz parte do Projeto Lendo Margaret Atwood. Veja AQUI a lista de títulos com os links para minhas resenhas já publicadas. Para ver as resenhas que a Lulu preparou especialmente para o projeto, clique AQUI.
2 comentários:
Mi, sua resenha ficou muito boa e com bons questionamentos.
Relevante o trecho que você comenta do jovem Barba Negra: “contrariando as intenções de seu criador”. Uma alusão ao livre arbítrio da religião cristã? Teriam os crackers (e os mestiços) o mesmo desenvolvimento e destino dos homens?
No mais, tivemos novamente uma leitura excelente do nosso projeto lindo e agradeço de coração a companhia (^_^).
Beijos!
Oi, Lulu!
Tem a ver com a religião cristã também, essa coisa da pureza que está diretamente relacionada ao conhecimento (no caso, à falta de conhecimento - quando a humanidade começa a fazer perguntas e come o fruto proibido, é expulsa do Paraíso). Acho que isso tem muito a ver com as intenções do criador dos Crackers: ele queria que eles se mantivessem puros, e a leitura e a escrita os corrompem.
Muito obrigada por mais essa leitura conjunta!
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