segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Leia o Livro, Veja o Filme: O Bigode / La Moustache (Emmanuel Carrère)


Homem comum, tentando mudar alguma coisa em sua vida de dias tão iguais, decide raspar o bigode. Com isso pretendia, além de mudar algo em si mesmo, surpreender as pessoas. No entanto, o único surpreso foi ele mesmo: ninguém percebeu a mudança. Pior, todos afirmaram veementemente que ele não usava bigode há anos. Seria fingimento? Brincadeira de mau gosto? Sonho? Delírio?

A história começa com Marc, o protagonista, perguntando à esposa, Agnes, o que ela acharia se ele raspasse o bigode. Ela responde que seria uma boa ideia e então vai ao mercado. Quando retorna, Marc evita olhá-la diretamente, antecipando sua reação de surpresa, deliciando-se com os bons momentos que teria ao explicar aos amigos os motivos da mudança. Entretanto, Agnes não nota nada de diferente. Sabendo de seu espírito brincalhão e conhecendo sua grande capacidade de sustentar uma mentira, ele não fala nada, pois estava certo de que, no jantar, os amigos não deixariam de perceber. Ao chegar à casa dos amigos, mais uma vez ninguém menciona a ausência de seu bigode. Teriam eles combinado a farsa?

Descobri esse livro por acaso, depois de ler comentários sobre o filme. Achei interessante e fui atrás de ambos. O livro é narrado em terceira pessoa, apesar de o tempo todo vermos as coisas pela ótica de Marc. Conhecemos seus pensamentos, partilhamos de suas dúvidas, sofremos das mesmas angústias. Ao raspar o bigode, Marc abre mão não apenas de tufos de pelo, mas de sua identidade. O que seria apenas um ato corriqueiro se transforma em uma história carregada de tensão psicológica, na qual vemos Marc duvidar da sanidade da esposa, questionar a própria lucidez e imaginar um complô persecutório. Mesmo depois de finda a última página, não há certeza sobre o que aconteceu.

Quanto ao filme (que sabe-se lá porque cargas d’água resolveram chamar de “Amor Suspeito”), é superfiel ao livro e nem poderia ser de outra forma, já que o autor é também roteirista e diretor da adaptação cinematográfica. As poucas mudanças foram feitas por necessidade e, de certa forma, melhoraram ainda mais a trama. A contraposição entre a intensa música clássica da trilha sonora e o silêncio completo de algumas cenas é um ponto forte do longa. O final é diferente, mas, neste caso, não importa, já que, como no livro, ao subirem os créditos de encerramento, as interrogações permanecem. E você se pega tentando juntar as peças, pensando se perdeu alguma coisa...

Enfim... livro e filme são muito bons. Recomendo fortemente, mas passe longe se imaginar desfechos, elaborar teorias e discutir hipóteses não é sua praia. Vá fundo se gostou dos delírios de "A Metamorfose" e "Crime e Castigo".

3 comentários:

Anônimo disse...

Oi, Michelle :) Eu fiquei sabendo do livro em outro blog, mas ainda não achei pra ler. Tem um tema bem distinto.

Porém, não sabia que havia um filme e gostei de conehcê-lo.

Bjs ;)

Anônimo disse...

Oi, Mi! Que história curiosa...! Não conhecia este livro/filme, mas imagino que deve ser daqueles que te deixam com a pulga atrás da orelha muito depois de ter terminado.
bj

Michelle disse...

Ana,
A edição mais recente do livro é de 2002. São poucas páginas, mas elas te arrastam para dentro da história. Vale muito a pena!

Júlia,
Isso mesmo! Há várias interpretações. É daqueles para passar horas discutindo com os amigos.