sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Veja Mais Mulheres: Filmes #37-41



Vocês já devem ter visto (ou não... rs) que estou participando do “Bingo da Literatura Negra”. Para manter o tema do mês da Consciência Negra, decidi combiná-lo com o #vejamaismulheres. Então aqui está minha listinha com 5 filmes dirigidos por diretoras negras e que têm protagonistas negros. Vamos lá!

Eu não sou uma feiticeira (I am not a witch, 2017 – Rungano Nyoni) [Zâmbia]
Uma garota de oito anos aparece sozinha numa zona rural zambiana. Alguns incidentes bobos (como um latão d’água derramado, por exemplo) fazem o povo do vilarejo suspeitar que a garota é uma bruxa. Então, ela é levada para a delegacia e ali mesmo é julgada e condenada – de acordo com a tradição local, ela deve morar em um acampamento de feiticeiras e usar uma espécie de guia comprida afixada às suas costas e presa, na outra ponta, a um carretel gigante. Com imagens muito bonitas, o filme usa o sarcasmo para mostrar como as bruxas - desde tempos remotos a representação de mulheres livres e, portanto, perigosas - são exploradas de todas as formas: como força de trabalho nas lavouras, como objetos exóticos que turistas imortalizam em suas fotos, como seres poderosos capazes de fazer chover para salvar as plantações, como bodes expiatórios para tudo que dá errado na aldeia. Pelos mais diversos motivos, essas mulheres são consideradas bruxas e, assim, têm apenas duas opções na vida: aceitar uma existência à margem da sociedade, sendo controladas por suas rédeas curtas, ou cortar a fita que as impede de voar, o que fará com que se transformem em cabras (que certamente terminarão na panela). Maravilhoso demais. Recomendo fortemente.
Nota: 4,5/5
Rungano Nyoni é uma atriz, roteirista e diretora nascida no Zâmbia que se mudou para o Reino Unido ainda criança. Ela interpretou papéis em dois filmes e uma série de TV, mas queria mesmo dirigir. Seus cinco curtas-metragens ganharam vários prêmios pelo mundo e, em 2017, ela dirigiu seu primeiro longa, ‘Eu não sou uma feiticeira’.

Café com Canela (Café com Canela, 2017 – Glenda Nicácio) [Brasil]
Violeta é uma mulher jovem, que tem marido e filhos e ainda cuida com delicadeza da avó velhinha e acamada. Apesar dos dias cheios, Violeta está sempre de bom humor quando sai pedalando pelas ruas do bairro para vender seus salgados. Um dia, o acaso leva Violeta até a porta da casa de sua antiga professora, Margarida, que há anos vive isolada, em um luto perpétuo desde a morte do filho criança. Mexer em feridas antigas é sempre doloroso, mas Violeta não é do tipo que desiste facilmente. Gravado numa pequena cidade do Recôncavo Baiano com equipe e atores locais, o filme encanta ao mostrar a aproximação dessas duas mulheres de gerações diferentes e que aparentemente não têm muito em comum, mas que dividem uma história de superação e apoio mútuo. Apesar de uma ou outra cena meio confusa, gostei demais do filme, das personagens, da forma sutil que as protagonistas têm de demonstrar que estão ali, prontas para ajudar, mesmo quando não estão presentes pessoalmente.
Nota: 4/5
Glenda Nicácio é uma diretora brasileira. ‘Café com canela’ é o primeiro longa-metragem que codirigiu com Ary Rosa, seu sócio na produtora Rosza Filmes. Em 2018, a dupla lançou seu segundo longa: ‘Ilha’. Leia aqui a entrevista com a diretora feita pelo pessoal do Mulher com Cinema.

Filhas do Pó (Daughters of the Dust, 1991 – Julie Dash) [Estados Unidos]
A história se passa em 1902, em uma das ilhas marítimas da região que compreende a costa da Geórgia e da Carolina do Sul. Sendo uma área que permaneceu isolada do homem branco durante muito tempo, tradições africanas persistiram e, aos poucos, foram se misturando com as influências americanas. Nesse cenário em que o antigo e o novo se chocam, uma família se prepara para deixar a ilha e ir viver no continente, e o momento é delicado: a matriarca se recusa a ir embora e se apega aos seus velhos costumes e a uma lata em que guarda pequenos objetos que a ajudam a manter viva sua memória; ao mesmo tempo, parentes que já moram no continente chegam para ajudar na viagem e para rever gente com quem havia muito não falavam. Nesse ambiente de lembranças e planos, o que é diferente gera discussões; alguns estão abertos a mudanças, outros se recusam a pensar de outro modo. O mais interessante é que a história é narrada por uma menina que ainda está na barriga da mãe, numa posição privilegiada que lhe permite observar as coisas de vários ângulos. É um filme importante pelas questões que discute, mas achei a montagem meio confusa, com uns cortes estranhos. De todo modo, vale dar uma espiada.
Nota: 3,5/5
Julie Dash é uma produtora, roteirista e diretora norte-americana que já dirigiu alguns curtas, três filmes para a TV – entre eles ‘Tempo de ser livre’ (2000) e 'A história de Rosa Parks' (2002) –, dois documentários e dois episódios da série de TV ‘Queen Sugar’ (2017). Em 1991, ‘Filhas do pó’ foi o primeiro filme dirigido por uma cineasta negra a ser exibido nos cinemas norte-americanos, e, em 2004, foi escolhido para ser preservado nos arquivos da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos, sendo considerado uma obra importante dos pontos de vista histórico, cultural e estético.

Um Reino Unido (A United Kingdom, 2016 – Amma Asante) [Inglaterra]
Esta cinebiografia é inspirada na história real de Seretse Khama, o príncipe herdeiro de Bechuanalândia, atual Botsuana, que, pouco depois da Segunda Guerra, enquanto estudava na Inglaterra, se apaixonou e se casou com Ruth Williams, uma garota branca, filha de um pequeno comerciante. Obviamente, o relacionamento deles é um escândalo, não só por causa da questão interracial, mas também porque ele deveria voltar ao seu país natal e assumir o trono. O casamento de Seretse e Ruth cria um problema diplomático que envolve questões do apartheid da África do Sul, o interesse da Inglaterra em explorar pedras preciosas em Bechuanalândia e empresas mineradoras americanas desembarcando no país natal de Seretse. O filme é bem tradicional em sua narrativa, mas gostei muito dos atores e achei a história interessante (não fazia ideia dos acontecimentos que levaram à independência de Botsuana). E ainda mostra a importância das mulheres, mais abertas ao diálogo e à pacificação, na resistência modesta e na resolução dos conflitos.
Nota: 3,5/5
Amma Asante é uma roteirista e diretora inglesa que começou a carreira como atriz na infância. Como diretora, lançou seu primeiro longa, ‘A way of life’, em 2004, e, desde então já lançou mais três filmes (o mais recente deles, ‘Where hands touch’, em setembro de 2018), e tem outro em fase de pré-produção.

Além dos Limites (Love & Basketball, 2000 – Gina Prince-Bythewood) [Estados Unidos]
Quincy costumava ser o melhor jogador de basquete do bairro, mas a chegada de Monica o desestabiliza – como ela podia jogar tão bem sendo menina? Desde a primeira vez que se viram, eles competem nas quadras. Passam a infância disputando para provar a superioridade, começam a namorar na universidade, enquanto batalham individualmente por suas carreiras, mas quando se torna impossível manter o relacionamento sem que isso afete o treino, eles têm que escolher do que vão abrir mão. À primeira vista, parece mais um filme da “Sessão da Tarde” que trabalha bem os clichês do romance: casal se conhece, se detesta, se aproxima, se separa e tem uma segunda chance. Mas nas entrelinhas há muito mais sendo discutido. Para começar, a comportamento esperado das mulheres: Monica é constantemente cobrada para ser “mais feminina”, menos briguenta, enquanto a agressividade é vista como algo positivo nos colegas masculinos; depois, o valor menor que o trabalho feminino tem (tanto Quincy quanto Monica fazem parte de times universitários, mas o masculino tem prestígio, cobertura na mídia, aura de celebridade para os jogadores, a NBA como objetivo máximo, enquanto o feminino é ignorado, tem pouco investimento e não tem uma liga de renome na qual as moças possam seguir carreira); o fardo da maternidade (a mãe de Monica, a mãe de Quincy e uma das jogadoras selecionadas para a equipe universitária veem seu sonho de ter uma profissão terminar ainda na adolescência porque engravidam, enquanto seus pares seguem com suas vidas sendo pouco abaladas). Resumindo, gostei muito mais do filme do que imaginei que gostaria. E deixo aqui a sugestão para vocês.
Nota: 3,5/5
Gina Prince-Bythewood é uma roteirista e diretora norte-americana que, logo após se formar em cinema na UCLA, começou a escrever roteiros para séries de TV. Como diretora, seu primeiro longa-metragem foi ‘Sem vestígio’, de 2000, mesmo ano de 'Além dos limites', que foi concebido e produzido durante o laboratório de escrita e direção de Sundance e abocanhou doze prêmios no total. Ela também dirigiu 'A vida secreta das abelhas', adaptação do livro de mesmo nome, lançado no Festival de Cinema de Toronto de 2008.

>> Outros filmes com protagonistas negros dirigidos por cineastas negras que já postei

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Este post faz parte do projeto Veja Mais Mulheres, criado pela Cláudia Oliveira. Para ver o post de apresentação desta terceira edição do projeto, que inclui minha lista de filmes e os links para as respectivas postagens, clique AQUI ou no banner da coluna à direita. Também dá para conferir o post de apresentação e a lista de filmes e links do primeiro ano e do segundo ano do projeto.

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