CONTO: The System of Professor Tarr and Doctor Fether
A
história se passa no século 19, e é
narrada pelo jovem médico que, tendo ouvido muito a respeito do Maison de Sante, um manicômio
particular que abrigava pessoas de famílias abastadas e utilizava métodos de
tratamento alternativos, decide ir conhecer a instituição. Ao chegar lá, por
indicação, é recebido pelo próprio superintendente do local, Monsieur Maillard. Espantado pela
aparente calmaria e normalidade do lugar, o visitante é logo advertido pelo
administrador: “Não acredite em nada que ouvir, e só em metade do que vir”.
O
conto é um excelente representante da escrita de Poe. Logo ao se aproximar do manicômio, o narrador descreve o
local: cercado por uma floresta úmida e sombria, isolado, com a construção em ruínas. Seu cavalo se
assusta e quer voltar – todos indícios de que havia algo de estranho e maligno
no local. Uma atmosfera 100% Poe.
Já
dentro do edifício, o visitante diz ao administrador que havia ouvido falar do
tratamento diferenciado dos pacientes, que nunca eram submetidos a punições
físicas e apenas raramente ficavam confinados. Em se tratando de uma
instituição psiquiátrica, era quase um milagre. O superintendente, então,
explica que o sistema funcionava muito bem, mas que fora obrigado a proibir as
visitas, pois o público deixava os doentes tensos. De acordo com ele, era tudo
muito simples: em vez de punir e repreender, bastava aplicar a lógica do
absurdo, ou seja, se um paciente achava que era uma galinha, então era só
alimentá-lo com milho e deixá-lo dormir no poleiro e ele se acalmava e vivia
feliz em seu mundo particular. Até os tratadores e enfermeiros haviam sido
dispensados: o sistema deixava todos os pacientes livres e uns cuidavam dos
outros. Realmente brilhante.
Então
o visitante é convidado a fazer uma ronda com o superintendente e a jantar com
eles. Diante da mesa suntuosa, o simples médico se sente constrangido ao ter à sua frente tantos candelabros, pratos requintados e iguarias. Os convivas eram médicos e
pacientes, mas, em meio à excentricidade daquela gente rica, era difícil saber
o que indicava loucura e o que era apenas costume da alta sociedade. O vinho
servido durante a refeição colabora ainda mais para alterar a percepção do
visitante. No fim, ele já não sabe o que é real o que é imaginação.
Achei
o conto muito bom. A atmosfera misteriosa, o comportamento dúbio de pacientes e
médicos, a mistura de realidade e fantasia vão criando uma expectativa de algo
horrível que está prestes a acontecer. E realmente acontece. A cena do jantar é
surreal e já entrega boa parte da resolução da história, mas isso não tira seu
brilho. No finalzinho mesmo, o superintendente revela o que era, de fato, o tal
método do Professor Tarr e do Doctor Fether (em português, o
Professor Alcatrão ou Piche e o Doutor Pena – o nome é importante porque está
diretamente relacionado com a aplicação do método).
“Quando
um louco parece completamente são, na verdade, é hora de colocá-lo em uma
camisa-de-força.”
Mais
um ótimo texto do Poe! Recomendo muito a leitura.
P.S. 1: Dá para ler o conto original em inglês AQUI.
P.S. 2: Tem um curta brasileiro muito bacana inspirado no mesmo conto AQUI. (Só recomendo ver depois da leitura, para não estragar a surpresa).
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FILME: Refúgio do Medo
Um
jovem psiquiatra recém-formado decide visitar o famoso Stonehearst Asylum, manicômio particular destinado a membros da
alta sociedade, conhecido por utilizar métodos de tratamento diferenciados. Ao
chegar lá, se encanta por uma talentosa pianista que parece sã, embora todos
lhe digam o contrário (inclusive ela mesma). O que parecia um lugar calmo e bem
organizado, logo se mostra um antro de perversidade e loucura.
Descobri esse filme lendo a crítica em uma revista de cinema. Assim que soube
que era baseado em um conto do Poe, fiquei louca para assistir e, claro, acabei
fazendo a leitura primeiro. A adaptação é muito boa e expande ainda mais o
universo criado pelo autor americano. O clima de “parece mas não é” foi intensificado, um romance foi criado,
muitas reviravoltas foram acrescentadas e o tal sistema do título original do
conto foi modificado – para pior, muito pior. Não no sentido de ter ficado
ruim, e sim porque ganhou contornos mais macabros (o que faz todo o sentido e
só melhorou a história).
O
filme é muito bonito visualmente e conta com um elenco afiado: Ben
Kingsley interpreta o superintendente, Jim Sturgess é o médico
novato, Kate Beckinsale vive o objeto de desejo do jovem médico e Michael
Caine encarna o Doutor Salt, um médico mais inclinado aos tratamentos
antigos.
Em
geral, o filme prende a atenção até o fim, o suspense é contínuo e as
reviravoltas são bacanas - basta lembrar do conselho do administrador: “não
acredite em seus ouvidos e menos ainda em seus olhos”. O romance entre
o novo médico e a paciente supostamente sã é interessante e convincente. A
única coisa que me desagradou foi a explicação de como eles se conheceram
(achei muito forçado e improvável, ainda mais por se passar no século 19) e
certos momentos de indecisão do visitante causados pela paixão (isso sempre me irrita).
Enfim...
é um filme muito bom e altamente recomendável para fãs de suspense.
Trailer legendado:
Um comentário:
Adorei, Michelle!
Nunca tinha ouvido falar desse filme, e olhe que gosto muito dessa atriz. Mas acho que vou ler o conto antes.
Beijo! ^_^
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