terça-feira, 22 de março de 2022

Resenha: Bartlebly, o escriturário


A história é narrada pelo chefe de Bartleby. Apesar de viver uma rotina de trabalho intensa, ele diz que a melhor maneira de viver é encarar tudo com tranquilidade. Isso ajuda a entender, em parte, suas reações diante da inércia do escriturário Bartleby, que começa no escritório de advocacia como um copista ideal: dedicado, capaz de realizar um trabalho impecável, silencioso, discreto… uma sombra. Seu jeito de ser contrasta com o dos seus dois colegas de repartição: um que era cortês de manhã e insolente à tarde, e outro que sofria do estômago de manhã e era afável depois do almoço. Isso mostra que eram previsíveis, o que o chefe apreciava.

Quando era um fantasma sem vontades e queixas, Bartleby era perfeito. Mas um dia o chefe lhe pede algo e ele responde: “Prefiro não fazer”. Não foi rude, só expressou sua preferência. O chefe é pego desprevenido e deixa passar. Só que Bartleby passa a dar essa resposta com frequência cada vez maior, e o chefe, querendo evitar o confronto, vai relevando. Até que Bartleby para de trabalhar e, pior, se recusa a ir embora. Ele se torna um enigma para o chefe, que tenta de tudo para fazê-lo deixar o escritório e não consegue.

Em pouquíssimas páginas, Melville criou uma história que parece simples, mas que gera muitas perguntas. Seria Bartleby um funcionário que se rebela de um jeito inusitado contra o sistema que transforma a todos em peças de uma máquina que não pode deixar de funcionar nunca e que tritura as vontades individuais? Seria ele um maluco? Seria apenas folgado? Seria uma criatura que se tornou apática por ter trabalhado antes na seção de cartas extraviadas dos correios, exercendo a função de queimar palavras que jamais chegariam a seus destinatários, e acabando, assim, totalmente indiferente ao futuro? Não sabemos. Mas o livro dá o que pensar, e por isso já vale a leitura.

“O que eu vi naquela manhã me persuadiu de que o escriturário era vítima de uma perturbação mental inata e incurável. Eu podia ter pena do seu corpo, mas o corpo não o fazia sofrer; era a alma que sofria, e esta eu não podia alcançar”.

Nota: 3/5

(Publicado no Instagram em 15 de setembro de 2021)

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