segunda-feira, 10 de julho de 2017

Resenha: O país das mulheres


Em seu segundo ano de mandato, ao término do discurso de celebração do Dia da Igualdade em Todos os Sentidos, a presidenta Viviana Sansón sofre um atentado e acorda em um estranho galpão cheio de objetos que perdera ao longo da vida. Enquanto ela tenta descobrir por que está ali, Eva, Martina, Rebeca, Ifigenia e Juana de Arco, suas ministras e amigas de longa data, se desdobram para seguir os planos de governo e lidar com a oposição na ausência da recém-eleita líder do Partido da Esquerda Erótica.

A história se passa no fictício e pequenino país latino-americano de Fáguas, que, assim como seus vizinhos, sofre com a roubalheira e a impunidade por parte de seus governantes, os quais, independente do partido, colecionam promessas não cumpridas e descaso para com seus eleitores. Então, cansadas de serem terem suas reivindicações ignoradas ano após ano, Viviana e suas amigas decidem se lançar na política com propostas diferentes e inusitadas, como substituir o PIB pelo índice de felicidade per capita e a introdução do conceito de cuidadã(o), deixando o cuidado de crianças e a zeladoria dos bairros nas mãos de todos, dividindo a responsabilidade de forma igualitária e educando para a liberdade.

O plano de governo das eróticas era, de fato, inovador, mas elas contaram com uma ajuda inesperada: a erupção do vulcão Mitre e a misteriosa queda de testosterona dos homens de Fáguas. Assim, com o instinto combatente masculino adormecido, os homens ficaram mais abertos a novas propostas, e o PEE foi eleito, enfatizando em sua campanha características normalmente atribuídas a mulheres (e, portanto, desvalorizadas) e assumindo um comportamento típico de mães para convencer seus eleitores.

“Por isso fizemos este manifesto, para levar ao conhecimento de mulheres e homens que já podem deixar de esperar pelo homem honrado e apostar agora em nós, as mulheres do PEE (Partido da Esquerda Erótica). Somos de esquerda porque acreditamos que um gancho de esquerda no queixo é o que merecem a pobreza, a corrupção e o desastre deste país. Somos eróticas porque EROS significa vida, que é o mais importante que temos, e porque nós, mulheres, não só estivemos desde sempre encarregadas de gerá-la, mas também de mantê-la e protegê-la; somos o PEE porque nada mais nos sustenta além do desejo de caminhar para frente, de traçar um caminho ao andar e de avançar com aqueles que nos seguem. Prometemos limpar este país, varrê-lo, esfregá-lo, sacudi-lo e lavar o lodo até que brilhe em todo o seu esplendor. Prometemos deixá-lo reluzente e com cheiro de roupa passada.”

Uma das coisas que mais me agradaram no livro foi a campanha eleitoral das eróticas, que abraçou todos os preconceitos e conceitos negativos (putas, loucas, feministas, comunistas) e habilidades que supostamente são inatas às mulheres (limpar, cozinhar, cuidar de crianças) e os transformou em bandeira, dando um caráter positivo a eles. A seção de material publicitário é hilária e traz ótimas sacadas (como, por exemplo: colocar na embalagem de aspirina os dizeres 'Acabe já com as dores de cabeça – dê o primeiro passo e una-se ao PEE’; e dentro das fraldas o texto ‘O país está mais cagado que seu filho - dê o primeiro passo e una-se ao PEE’) e se aproveitar do uso de mulheres como objeto na publicidade para passar as mensagens do partido concentradas nos peitos e bundas de modelos. A estratégia de organizar falsas reuniões de Tupperware e falsos chás de bebês para passar informações sobre o partido também me pareceu muito boa.

Com muito humor, a autora consegue expor a nada engraçada realidade das mulheres nas esferas profissional e doméstica e faz pensar não só nas desiguais oportunidades entre os sexos, mas também em problemas recorrentes nos governos e em soluções criativas para eles. Talvez as propostas revolucionárias do PEE só sejam mesmo possíveis em um país de minúsculas dimensões como o fictício Fáguas, que conta ainda com a sorte de ter um vulcão que inibe a testosterona e com o utópico fim do celibato na Igreja Católica, mas não deixam de proporcionar, ao menos, uma boa leitura.

Nota: 4/5 

O livro será discutido no Leia Mulheres - SP no dia 22 de julho, sábado, às 16:00, no Centro Cultural São Paulo.


Este post faz parte do Desafio Volta ao Mundo em 80 Livros[Nicarágua]Para ver a apresentação do projeto e a lista de títulos/resenhas, clique AQUI ou no banner na coluna à direita.  

Um comentário:

Anônimo disse...

Deve ser uma história curiosa!!