Vinte
e um de dezembro de 2012, suposta data do fim do mundo, de acordo com uma
previsão maia. Em 'Pseudônimo Mr. Queen' o mundo terminou mesmo, mas não
com uma catástrofe natural que impossibilitaria que homens e animais
continuassem vivendo, e sim com uma reconfiguração: a maior parte da população
mundial simplesmente desapareceu sem deixar vestígio e as cidades foram mudando
aos poucos, com o sumiço gradual das construções e dos bens materiais. As
pessoas agora precisavam se ajustar às novas regras de existência, que lhes
eram informadas em sonho: todos teriam 2 vidas, sendo a primeira até os 70
anos e a segunda dos 20 aos 100, sem um segundo a mais ou a menos. Na nova
sociedade não haveria desigualdade social, nem dinheiro, nem doenças – tudo
perfeito. Pelo menos aparentemente.
Deixa
eu começar dizendo que li o livro a convite da autora, Loraine Pivatto, que foi supersimpática e
me mandou mensagem no Skoob perguntando se eu queria participar do book tour
que ela estava organizando. Ultimamente, tenho evitado leituras nesse esquema
porque meu cronograma de trabalho está totalmente maluco, mas me interessei
pela sinopse e botei meu nome na lista. Alguns meses depois, o livro chegou
aqui em casa e comecei a ler.
O
livro é dividido em três partes, e em cada uma delas a protagonista é uma
mulher da família Brandão: Regina, Larissa e Vitória, respectivamente avó, mãe
e neta, ou seja, três gerações e suas experiências nessa sociedade
reconfigurada. Pessoalmente, me conectei mais com Regina e com os dramas
vividos pelas pessoas que fizeram a transição do mundo antigo para o novo, talvez
porque seja mais fácil imaginar o que elas sentiram ao acordar sem saber onde
estavam, sem ter ideia do que havia acontecido, desesperadas para encontrar
amigos e familiares, vendo o entorno se modificar, perdendo grande parte do que
as definiam (emprego, casa, estilo de vida), tendo que se ajustar a novas
regras que nem mesmo entendiam direito.
Na
verdade, a parte inicial me lembrou bastante 'Os deixados para trás', livro
que adoro e que virou a série de TV 'The leftovers', igualmente
maravilhosa, que também trata do sumiço inexplicável de grande parte das
pessoas do planeta numa espécie de Arrebatamento. No entanto, no livro da
Loraine, alguns escolhidos não estavam totalmente no escuro: eles conheciam o
segredo da morte. Lembram que eu disse que ninguém podia viver um segundo a
mais nem a menos? Então... a impossibilidade de morrer prematuramente pode ser vista como uma bênção, mas não para todos. Algumas pessoas simplesmente não se adaptaram à nova forma de vida e se sentiam deslocadas o tempo todo, tentando, sem sucesso, o suicídio. Uma alternativa para
essas pessoas era se
refugiar nos ‘gavetões do sossego’, um recurso oferecido pelo governo que
permitia às pessoas decidir por quantos anos queriam ficar ‘desligadas’ em um
sono profundo. Achei a ideia bem original.
Como
sempre acontece, até as coisas mais incríveis e as melhores invenções uma hora
começam a revelar um lado ruim ou a serem usadas de um jeito equivocado. A nova
sociedade parecia perfeita, mas era composta por seres humanos, ou seja, é
claro que ia desandar... Embora não houvesse dinheiro para criar diferenças
sociais, logo surgiu um esquema de classificação dos indivíduos de acordo com
as funções que realizavam e com a importância atribuída a elas pelos outros
membros da comunidade. Começavam então as diferenciações, e aos poucos foram aumentando as disputas e insanidades que as pessoas fazem para ter um status
profissional (e depois social) maior. Toda essa loucura de competição é alimentada
por um tal de Happiness Book, nada mais que nossa boa e velha rede
social com toques de Black Mirror. Mais um ponto positivo para a autora por
criticar o culto à futilidade e à ambição.
Foram
esses os assuntos da trama que mais me interessaram. Embora eu tenha iniciado a
leitura pensando que se trataria de uma ficção científica, os aspectos
tecnológicos e a explicação do que causara o sumiço das pessoas e a mudança do
universo (alienígenas, efeitos químicos, intervenção divina) tiveram menos
importância do que o aspecto humano. Para mim, é uma história sobre segundas
chances e recomeços. Aliás, a profecia maia nunca foi de destruição do mundo, e
sim de encerramento de um novo ciclo para o início de outro (e é disso que o
livro fala). Mas a humanidade tem um senso (auto)destrutivo impressionante. Já
estragou tudo uma vez e quando tem a possibilidade de recomeçar do zero, de fazer as
coisas de um jeito novo, de se reinventar, de corrigir os erros (principalmente
porque nessa nova sociedade as pessoas levam suas memórias da primeira vida
para a segunda - não seria ótimo poder tentar novamente sem cometer os mesmos
deslizes?) continua exibindo o mesmo comportamento destruidor.
Por
que três estrelas então? Porque achei que havia personagens em excesso e que ficou
muito corrido acompanhar a vida de três gerações em quatrocentas páginas - em
certo momento deixei de me importar com eles. Outra coisa que me incomodou
demais foram as relações nocivas entre as personagens femininas – todas são de
disputa, de inveja, destrutivas. É claro que existem algumas assim, mas em três
gerações só esse tipo ser apresentado é muito problemático e só reforça esse
estereótipo. Alguns diálogos soaram um pouco artificiais também.
De
resto, só quero agradecer à Loraine pelo convite e parabenizá-la pelo trabalho
e pela iniciativa de fazer a tiragem dos exemplares de modo independente e de
circular a história por meio de book tour. Ah, o e-book está à venda na Amazon. Acredito que com uma boa edição e
uns poucos ajustes 'Pseudônimo Mr. Queen' ficará redondinho. Sucesso e que
venham os próximos!
“Pelo
menos agora, com as novas regras sociais, a vida humana estava preservada. A
barbárie tinha cessado. Mas os sobreviventes... Ah! Os sobreviventes
continuavam os mesmos homens e mulheres da vida antiga, cheios de empáfia,
arrogância e presunção. Ou talvez ainda piores.”
Nota: 3/5
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