Giovanna está no começo da adolescência e, um dia, ouve seus pais comentando que ela está ficando igualzinha à tia Vittoria, de quem ela nem se lembra, já que a mulher tinha sido eliminada da vida da família fazia muito tempo, e até mencionar o nome dela em casa era proibido. Aquilo a faz pensar que o pai, seu herói na época, não gosta mais dela e a acha feia. A jovem decide, então, ir atrás da tia que mal conhece, para ver com os próprios olhos o que em Vittoria causava tanto desgosto em seu pai, e planeja fazer de tudo para não ser como ela. É assim que a garota descobre que vivia num mundo de inocência e ilusão. Conforme ela vai desbravando o mundo dos adultos, também tem início sua transformação física e mental.
Mais uma vez Ferrante faz seus personagens circularem por dois universos distintos: o intelectual, habitado por pessoas de classe social mediana que mantêm as aparências a qualquer custo; e o da gente simples e muitas vezes rude, que em muitos casos sonha em deixar para trás uma vida dura e violenta, e que enxerga melhor o que há por trás das máscaras de felicidade eterna.
Os dilemas de Giovanna são relacionados ao seu corpo e à sua sexualidade, e também se referem às suas raízes. Ela cresceu num ambiente bonito, protegido e falso, mas por suas veias corre o sangue do proletariado napolitano, da parte baixa da cidade, onde a sujeira e a feiura são mais evidentes, mas também é onde ela conhece gente que sabe demonstrar seus sentimentos. Em certo momento a garota decide abraçar suas origens e externalizar a feiura que tanto a aterrorizava, como uma forma de afrontar os pais, que mentiram para ela a vida toda. Mas ela é, também, fruto do espaço onde cresceu e gosta, de fato, de questões intelectuais. Encontrar o equilíbrio dessas suas duas metades é algo que ela busca aprender em sua jornada adolescente.
O que mais me agrada em todos os livros da Ferrante é sua capacidade de criar personagens absurdamente verossímeis, cheios de defeitos, nuances e contradições. Giovanna é uma adolescente e está testando limites, vivendo experiências, questionando padrões e regras. Em muitos momentos ela é irritante, cruel e ingrata, com o ego nas alturas. As oscilações de humor são constantes. Ela erra (e muito). Os adultos que ela julga duramente também erram, mas, no geral, são apenas pessoas que, em sua busca pela felicidade, acabam magoando os outros. Não é assim no mundo real?
Mais uma ótima leitura.
Tem resenha de "Um amor incômodo" aqui no blog também.
“Nem eu nem Vittoria nem meu pai podíamos eliminar nossas raízes comuns e, portanto, acabávamos amando e odiando, dependendo do caso, sempre nós mesmos”.
Nota: 4/5
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