quarta-feira, 19 de junho de 2013

Resenha: Ratos


“Minha mãe e eu vivíamos em um chalé a cerca de meia hora da cidade. Não foi fácil encontrar uma casa que satisfizesse a todas as nossas exigências: no campo, sem vizinhos, com três quartos, jardins na frente e nos fundos. Um imóvel que fosse antigo (precisava ter “personalidade”), mas ao mesmo tempo confortável – um sistema de aquecimento moderno era essencial, pois detestávamos sentir frio. Precisava ser silencioso. Precisava oferecer privacidade. Afinal, éramos ratos. Não procurávamos um lar. Procurávamos um lugar onde pudéssemos nos esconder”.
(sinopse da capa traseira)

A narradora do livro é Shelley, uma garota de 16 anos que carrega na alma e no corpo marcas da violência sofrida na escola. Aliás, é o bullying, somado a um divórcio problemático dos pais, que resulta na busca de um refúgio por parte de mãe e filha. Embora ambas sejam inteligentíssimas e perfeitamente capazes de cuidar de si mesmas, não o fazem, pois são mulheres amedrontadas, dóceis, obedientes, ingênuas... são verdadeiros ratos. Ainda que tenham consciência disso, não conseguem reagir e se impor, não sabem o que fazer para controlar o medo.

A mudança para o campo parecia, sem dúvida, a saída perfeita: um lugar calmo e isolado, distante do caos da cidade grande, afastada das agressoras de Shelley, longe o bastante das humilhações causadas pelo ex-marido de Elizabeth, a mãe. No pequeno esconderijo chamado de lar, mãe e filha estabelecem uma nova rotina e tentam reconstruir suas vidas. Tudo vai bem até que elas se vêm envolvidas em um novo episódio de violência. E agora? Abaixar a cabeça e seguir ordens, rezando para que tudo acabe logo ou juntar o que resta de dignidade e resistir, mesmo que isso possa ter um desfecho trágico?

“Mamãe fez o que ele queria, obedientemente. Afinal, ele sabia o que era melhor; era mais velho, era sócio na empresa, era homem. Como ela poderia resistir, ainda que quisesse? Como um rato resiste a um gato? Por isso, ela abriu mão do emprego que amava e, durante quatorze anos, dedicou-se a cuidar de mim e da casa – cozinhar, fazer compras, lavar, passar -, enquanto meu pai se tornava um dos principais sócios da Everson’s”.

A primeira coisa que chamou minha atenção na época do lançamento do livro foi a capa: uma entrada de toca de rato no rodapé de uma parede manchada de sangue. A imagem por si só já é forte, e o efeito é melhorado pela capa vazada no local da toca, o que cria realmente um buraco. Lindíssima.

A capa e a sinopse que eu copiei ali no parágrafo introdutório bastaram para me convencer a ler o livro. Nem cheguei a conferir a contracapa, então não sabia que a história tratava de bullying. Para mim, foi uma surpresa. Apenas outras formas de violência haviam passado pela minha cabeça. E elas realmente existem e são igualmente revoltantes, mas não vou revelar mais que isso aqui.

A narrativa em primeira pessoa de Shelley nos dá uma perspectiva interessante da história, já que só sabemos o que aconteceu segundo ela e os relatos são permeados de suas observações pessoais, críticas, medos e vontades. Mesmo assim, é praticamente impossível não se identificar com as dores e angústias da protagonista, não torcer por ela e por sua mãe, não desejar fazer justiça por meio delas.

O fato é que o livro leva a reflexões importantes, como ‘o que diferencia legítima defesa de ataque?’, ‘o que é justo e o que é justiça?’, ‘o Estado consegue mesmo garantir a segurança dos seus cidadãos?’. O que dá para perceber é que, quando a própria vida ou a vida de entes queridos está em jogo, até mesmo ratos podem se transformar em ferozes leões.

Apesar de ser um tema sério e de ter um clima tenso, o livro é fácil e rápido de ler e prende a atenção até o fim. Eu, que geralmente não consigo ler mais que 50 páginas por vez, devorei as 238 páginas do livro em apenas 2 dias, tamanha a curiosidade de saber como terminaria a história.

“Imaginei se existia alguma relação misteriosa entre as mulheres e o sangue. Eu não lidava com meu sangue desde que tinha doze anos, lavando-o de minhas mãos e de minhas roupas? Era algo que os garotos desconheciam totalmente. Seria o sangue, de alguma maneira, um domínio especial das mulheres? Por isso tantas mulheres se tornavam enfermeiras? Lembrei-me das enfermeiras do hospital onde me recuperara: mulheres que nunca desmaiavam ao ver sangue, não desviavam o olhar nem faziam caretas, porque não lhes causava medo; o sangue era um velho amigo".

Preciso dizer que recomendo muitíssimo?

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Este post faz parte do Desafio Literário 2013 - Mês de Junho: Romances Psicológicos. Para ver a lista de obras selecionadas e outros posts do DL2013, clique AQUI. 

5 comentários:

Anônimo disse...

Oi, Michelle! :)

Quando eu li o título do livro, não imaginei que se tratasse de bullying.

Pelo que deu pra perceber, é um livro forte e psicológico. Mas esse é um tema sério que, ao que parece, é discutido de maneira ampla no decorrer da trama.

A estrutura dele me fez lembrar, ligeiramente, de "Garotas de Vidro".

Bjs ;)

Melissa Padilha disse...

Oi Michelle!
Nossa há tempos que vejo esse livro vendendo e assim como você, a capa e o título sempre me chamaram muita atenção, mas ficava sempre na dúvida porque nunca tinha conhecido ninguém que tinha lido e nem tinha lido nenhuma resenha. Caramba perdi tempo a história parece muito boa !
Sua resenha me convenceu a lê-lo!
abraços
Melissa

Maura C. disse...

Fiquei com muita, muita vontade de ler esse livro, Michelle.

Livros ou mesmo filmes que tratem da temática do bullying me deixam agoniada, com necessidade de entrar na história e mandar que parem com aquilo, dizer que o que aquele grupo está fazendo é errado...

Talvez eu não tenha nascido para ler romances psicológicos, mas já anotei Ratos na lista de desejos e se o ler em breve, te digo o que achei...

Beigos!

Anna disse...

Wow... Adorei a sua resenha e já fiquei bastante curiosa acerca desse... Já vai pra lista dos que quero ler no skoob!! ;o)

Xerinhos, lindeza!
Paty

Michelle disse...

Ana,
Eu também não imaginava. Essa informação está na orelha interna, mas nem cheguei a ler essa parte antes de comprar. É tenso, viu?
E estou muito curiosa sobre "Garotas de vidro". Já li muitos elogios.

Melissa,
Eu me joguei. Acho que só tinha lido 1 resenha quando decidi comprar o livro. Não me arrependi.

Maura,
É bem angustiante. Dá raiva pela atitude dos agressores, pela apatia do agredido, pelas outras pessoas que percebem o que está acontecendo e não fazem nada... muito triste. Se tiver a chance, leia sim.

Paty,
Essa história desperta vários sentimentos. Nem todos eles bons, é verdade. Mas vale a pena.