quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

DL2013: Serena (Ian McEwan)



Serena Frome é uma jovem de vinte e poucos anos, vinda de uma família tradicional inglesa. Por insistência da mãe, vai estudar Matemática, apesar de suas habilidades medianas nessa área, obtendo, ao final do curso, um diploma sem honras e uma enorme frustração por não ter se formado em Letras. Ainda na universidade, começa a escrever matérias em pequenas publicações estudantis, e, com sua escrita agradável, logo é apresentada ao professor Tony Canning, de quem se torna amante e recebe treinamento para ingressar, por indicação dele, no MI5, o Serviço de Segurança Britânico.

"Eu era a mais simples das leitoras. Só queria o meu mundo, comigo dentro, devolvido para mim de maneiras artísticas e de uma forma acessível".

A história se passa no começo dos anos 70, quando a Inglaterra sofria uma grave crise econômica, lidava com as ameaças da Guerra Fria e ainda enfrentava ataques do IRA, o Exército Republicano Irlandês. Sabendo de tudo isso e do envolvimento do MI5, é óbvio concluir que "Serena" é uma clássica história de espiões. Bem... nada nesse livro é óbvio.

A trama envolve espionagem, claro. Mas esse é só o pano de fundo. É um livro feito de metalinguística e referências literárias. Serena, a protagonista-narradora, é uma leitora ávida, capaz de dar cabo em centenas de páginas em algumas horas (o que não quer dizer que suas escolhas sejam sempre de alto nível). E é justamente essa sua capacidade que faz com que ela deixe de ser uma simples secretária do MI5 e assuma sua primeira missão: selecionar para publicação um escritor alinhado com os ideais ocidentais, que apregoe, ainda que nas entrelinhas, as maravilhas do sistema capitalista, em troca de um financiamento (com dinheiro público) oferecido por uma instituição de fachada. OK, o escolhido não conhecia a origem do dinheiro, mas que escritor iniciante não ficaria agradecido pelo apoio, acreditando que seu talento era a única coisa que contou em seu favor?

No entanto, o que parecia ser uma missão simples começa a desandar quando Serena se envolve com seu alvo, o professor universitário Tom Haley. Aliás, grande parte dos problemas de Serena resulta de seus casos amorosos. Como fica claro ao longo da trama, o verdadeiro talento de Serena não era o domínio dos números, nem seus conhecimentos de política, tampouco sua erudição; ela era perita em conquistar os homens e em se apaixonar. Então, ao engatar um relacionamento com Haley, Serena passa a se questionar se deveria revelar sua identidade a ele ou seguir com a mentira, já que, se contasse, poderia colocar fim no romance, e, se não contasse, poderia ser descoberta, correndo o risco de levar ao rompimento do mesmo jeito. Além disso, ao quebrar as regras e se relacionar com Haley, ela havia ameaçado não apenas o sigilo da missão, mas também o seu emprego e toda a farsa elaborada pelo MI5.

"Uns contos mais fraquinhos não iam abalar a minha convicção de que ele era uma voz original, uma mente brilhante - e o meu amante maravilhoso. Ele era o meu projeto, o meu caso, a minha missão. A arte dele, o meu trabalho e a nossa história eram uma coisa só. Se ele fracassasse, eu fracassava. Simples, então - nós íamos triunfar juntos".

“Serena” é um livro cheio de detalhes, que requer atenção na leitura. Ao contrário do mundo glamoroso apresentado em histórias de espionagem populares, aqui não temos muita ação, perseguições ou tiros. O ritmo é até meio arrastado, para falar a verdade. Todavia, o brilhantismo de Ian McEwan se revela nas últimas páginas, com uma reviravolta inacreditável e um final surpreendente. Mesmo já tendo sido previamente advertida da manobra, não consegui antever o desfecho. Simplesmente sensacional!

Deixo aqui uma lista de alguns livros citados em “Serena”, que podem ser úteis a quem está procurando títulos que se encaixem no item 7 do Desafio Realmente Desafiante:

- A feira das Vaidades (William Makepeace Thackeray)
- O Vale das Bonecas (Jacqueline Susann)
- Octopussy [coleção 007] (Ian Flemming – no Brasil o título é “Encontro em Berlim”)
- A Revolução dos Bichos (George Orwell)
- 1984 (George Orwell)
- O Primeiro Círculo (Alexander Soljenítsin)
- Um Dia na Vida de Denisovich (Alexander Soljenítsin)
- O Colecionador (John Fowles)
- A Mulher do Tenente Francês (John Fowles)
- Cem Anos de Solidão (Gabriel García Márquez)
- O Complexo de Portnoy (Philip Roth)
- O Zero e o Infinito (Arthur Koestler)


Este post faz parte do Desafio Literário 2013 - Mês de Janeiro: Tema Livre. Para ver a lista de obras selecionadas e outros posts do DL2013, clique AQUI.

Mais uma leitura proporcionada pelo Livro Viajante do Skoob


9 comentários:

Flávia disse...

Hã? Como assim? Ela torna-se amante de um prof e tipo, "ah, vou te indicar para um ótimo emprego" e manda para o MI5? Fácil assim?

Esse livro realmente divide opiniões, porque já vi muitos não gostareme outros tantos gostarem. Não sei exatamente o porquê, mas ainda não despertou meu interesse.
Beijos

(Flávia Cabral - skoob)

Gustavo disse...

Michelle,
Que resenha boa!!!
Serena foi o 2º livro que eu li desde que comecei minha mania de leitura há cerca de 5 meses atrás. Pela inexperiência, acho que perdi algumas coisas ao longo da leitura, mas realmente o final foi surpreendente.
Você fez uma análise muito fidedigna...
Parabéns!

Tati disse...

Eu gostei de "Serena". Mas não é nada assim, de abrir a boca e ficar surpresa. É um livro bom, divertido, que não te cansa e conta uma história legal. A impressão que eu tinha lendo é que parecia um roteiro de filme. Com certeza vai virar daqui a um tempo e se brincar com a Emma Stone no papel de Serena (já que ela está em todos os lugares ultimamente).
Aliás, acho que o McEwan tem um fantasma na vida dele chamado "Reparação". Vai ser díficil superar aquele livro maravilhoso!
Beijo, adorei a resenha ;)
Tati

Michelle disse...

Exatamente, Fla!
Por que será que o prof. resolveu indicar a Serena para o MI5?

Gustavo,
Começou bem no mundo das leituras, hein?

Tati,
Este foi meu primeiro livro do autor e sempre vejo comparações com Reparação. Vou ser 'obrigada' a ler o outro, né?

Gabi Orlandin disse...

Oi Michelle!
Já li algumas resenhas deste livro, e todas foram exatamente como você: dizem que ele é difícil de ler por causa da história, mas a escrita do autor compensa. Apesar de "espionagem" não ser meu gênero favorito, ainda mais quando o livro não tem ação, admito que estou ficando bem curiosa para lê-lo por causa de resenhas como a sua. E a capa é linda, adoro!
Beijos.

Anônimo disse...

Já passei algumas vezes batido pela frente deste livro e agora deu coceira de comprar...!

Unknown disse...

humm...interessante!
Ainda não li...vou providenciar pra ontem... hehehe

Beijú!

Lídia
http://bomhumor-inabalavel.blogspot.com.br

Lígia disse...

Adoro o McEwan, mas não sei por que esse livro não me interessou tanto... Talvez porque eu não tenha gostado muito de "Solar", o romance anterior do autor.

Ainda pretendo ler "Selena", mas não é uma prioridade. Sua resenha me deixou curiosa para saber o final.

Beijo

Michelle disse...

Gabi,
O livro me ganhou no boca a boca. Uma resenha interessante aqui, uma recomendação acolá. Gostei muito da experiência.

Julia,
Se deu coceira de comprar... compre! (rs)

Lidia,
Legal! Espero que goste.

Lígia,
Eu tenho "Solar" aqui em casa, mas ainda não li. O duro de gostar de um livro é já ir cheia de expectativas para outras obras do mesmo autor, né?