Berlim,
2011. Sessenta e seis anos após seu suicídio, Hitler acorda em um terreno baldio. Desorientado, procura por seus
assistentes, tenta obter informações de um grupo de garotos que jogava bola por
ali. Depois de quase morrer atropelado ao atravessar uma rua movimentada, acaba
recebendo ajuda de um jornaleiro. Sem acreditar que tenha morrido e sem saber como viajou no tempo, tudo o que ele quer é restabelecer seu partido e
voltar ao poder. Só o que precisa fazer é se adaptar ao estranho mundo do Século
XXI...
A
premissa de ‘Ele está de volta’ é
muito boa: colocar uma das figuras mais polêmicas da história em um cenário
atual, dominado pela tecnologia e por novos hábitos. As inúmeras situações em que Hitler se depara
pela primeira vez com aparelhos eletrônicos são hilárias: sua indignação diante
dos programas de TV de baixa qualidade, suas dificuldades ao manipular um
celular, seu deslumbramento ao descobrir a internet e o mundo infinito de
informações ao seu dispor.
O
estranhamento causado por novos costumes da sociedade não é menor do que aquele
experimentado diante dos avanços tecnológicos: Pessoas recolhendo cocô de
cachorro das calçadas? Cidadãos comendo ração militar vendida em bancas de
jornal? Homens vestidos como mendigos e mulheres enfiadas em roupas colantes
para mostrar um corpo que não envelhece nunca? Lojas em que o próprio cliente
tem que pegar o que quer das prateleiras, sem um vendedor para ajudar?
Apesar
das diferenças assustadoras à primeira vista, as pessoas, no fundo, mudaram
muito pouco. Assim, o grande poder de orador de Hitler, aliado a uma mente
afiada e perspicaz que observa e aprende rapidamente, faz com que ele continue
conquistando seguidores, ainda que ninguém mais pareça interessado em guerra ou
nos ideais nazistas. Como ele logo percebe, a batalha deixou de ser por
territórios e agora é pela audiência.
De
uma forma inteligente e bem-humorada, Timur
Vermes usa uma figura icônica da história mundial para criticar a imprensa,
os programas de TV, os tabloides e revistas de fofoca e os políticos. Tudo passa pelo crivo do escritor: o culto
às celebridades, a fama repentina, a velocidade absurda com que histórias rodam
o mundo, o poder de transformar tudo em mercadoria e gerar lucro. Embora a
ficção criada pelo autor possa parecer loucura, tem muito de verdade no que ele
mostra. O que não deixa de ser perturbador.
“(...)
o que turvava de pronto a visão clara eram os inúmeros rabiscos irritantes em
todas as paredes. Eu já conhecia aquela técnica, pois naquela época em Weimar
os assessores comunistas espalhavam em todo o lugar seu disparate bolchevista.
E isso eu também sabia. Porém, no passado, era possível ler as palavras de
ordem de cada lado. Agora verifiquei que as inúmeras mensagens, que o autor
considerava importantes o suficiente para desfigurar a fachada das casas de
cidadãos honestos, eram totalmente indecifráveis. Eu podia apenas esperar que
esse analfabetismo fosse da corja esquerdista, mas como a legibilidade das
mensagens durante o meu caminho não mudava nunca, tive que supor que atrás
delas possivelmente também se escondiam informações importantes como ‘Acorde
Alemanha’ ou ‘Sieg heil!’, a saudação
nazista”.
Divertido
e reflexivo. Recomendo!
2 comentários:
Oi, Mi.
Quando ele foi lançado fiquei com vontade de lê-lo por causa da capa, porém, sua resenha me fez ficar bem interessada por esse livro.
;)
Maura,
Eu ri com o deslocamento do Hitler. Mas as críticas nas entrelinhas são fortes e fazem pensar nos comportamentos enviesados dos dias de hoje.
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