Vocês
já devem ter visto (ou não... rs) que estou participando do “Bingo da
Literatura Negra”. Para manter o tema do mês da Consciência Negra,
decidi combiná-lo com o #vejamaismulheres. Então aqui está minha
listinha com 5 filmes dirigidos por diretoras negras e que têm
protagonistas negros. Vamos lá!
Eu
não sou uma feiticeira (I am not a witch, 2017 – Rungano Nyoni) [Zâmbia]
Uma garota de oito anos aparece sozinha numa zona
rural zambiana. Alguns incidentes bobos (como um latão d’água derramado, por
exemplo) fazem o povo do vilarejo suspeitar que a garota é uma bruxa. Então,
ela é levada para a delegacia e ali mesmo é julgada e condenada – de acordo com
a tradição local, ela deve morar em um acampamento de feiticeiras e usar uma
espécie de guia comprida afixada às suas costas e presa, na outra ponta, a um
carretel gigante. Com imagens muito bonitas, o filme usa o sarcasmo para
mostrar como as bruxas - desde tempos remotos a representação de mulheres livres
e, portanto, perigosas - são exploradas de todas as formas: como força de
trabalho nas lavouras, como objetos exóticos que turistas imortalizam em suas
fotos, como seres poderosos capazes de fazer chover para salvar as plantações,
como bodes expiatórios para tudo que dá errado na aldeia. Pelos mais diversos motivos,
essas mulheres são consideradas bruxas e, assim, têm apenas duas opções na
vida: aceitar uma existência à margem da sociedade, sendo controladas por suas
rédeas curtas, ou cortar a fita que as impede de voar, o que fará com que se transformem em cabras (que certamente terminarão na panela). Maravilhoso
demais. Recomendo fortemente.
Nota:
4,5/5
Rungano
Nyoni é uma atriz, roteirista e diretora nascida no Zâmbia que se mudou
para o Reino Unido ainda criança. Ela interpretou papéis em dois filmes e uma
série de TV, mas queria mesmo dirigir. Seus cinco curtas-metragens ganharam
vários prêmios pelo mundo e, em 2017, ela dirigiu seu primeiro longa, ‘Eu
não sou uma feiticeira’.
Café
com Canela (Café com Canela, 2017 – Glenda Nicácio) [Brasil]
Violeta é uma mulher jovem, que tem marido e filhos e
ainda cuida com delicadeza da avó velhinha e acamada. Apesar dos dias cheios,
Violeta está sempre de bom humor quando sai pedalando pelas ruas do bairro para
vender seus salgados. Um dia, o acaso leva Violeta até a porta da casa de sua
antiga professora, Margarida, que há anos vive isolada, em um luto
perpétuo desde a morte do filho criança. Mexer em feridas antigas é sempre
doloroso, mas Violeta não é do tipo que desiste facilmente. Gravado numa
pequena cidade do Recôncavo Baiano com equipe e atores locais, o filme encanta
ao mostrar a aproximação dessas duas mulheres de gerações diferentes e que
aparentemente não têm muito em comum, mas que dividem uma história de superação
e apoio mútuo. Apesar de uma ou outra cena meio confusa, gostei demais do
filme, das personagens, da forma sutil que as protagonistas têm de demonstrar
que estão ali, prontas para ajudar, mesmo quando não estão presentes pessoalmente.
Nota:
4/5
Glenda
Nicácio é uma diretora brasileira. ‘Café com canela’ é o
primeiro longa-metragem que codirigiu com Ary Rosa, seu sócio na produtora
Rosza Filmes. Em 2018, a dupla lançou seu segundo longa: ‘Ilha’. Leia aqui
a entrevista com a diretora feita pelo pessoal do Mulher com Cinema.
Filhas
do Pó (Daughters of the Dust, 1991 – Julie Dash) [Estados Unidos]
A história se passa em 1902, em uma das ilhas
marítimas da região que compreende a costa da Geórgia e da Carolina do Sul.
Sendo uma área que permaneceu isolada do homem branco durante muito tempo,
tradições africanas persistiram e, aos poucos, foram se misturando com as
influências americanas. Nesse cenário em que o antigo e o novo se chocam, uma
família se prepara para deixar a ilha e ir viver no continente, e o momento é
delicado: a matriarca se recusa a ir embora e se apega aos seus velhos costumes
e a uma lata em que guarda pequenos objetos que a ajudam a manter viva sua
memória; ao mesmo tempo, parentes que já moram no continente chegam para ajudar
na viagem e para rever gente com quem havia muito não falavam. Nesse ambiente
de lembranças e planos, o que é diferente gera discussões; alguns estão abertos
a mudanças, outros se recusam a pensar de outro modo. O mais interessante é que
a história é narrada por uma menina que ainda está na barriga da mãe, numa posição
privilegiada que lhe permite observar as coisas de vários ângulos. É um filme
importante pelas questões que discute, mas achei a montagem meio confusa, com
uns cortes estranhos. De todo modo, vale dar uma espiada.
Nota:
3,5/5
Julie
Dash é uma produtora, roteirista e diretora norte-americana que já
dirigiu alguns curtas, três filmes para a TV – entre eles ‘Tempo de ser
livre’ (2000) e 'A história de Rosa Parks' (2002) –, dois
documentários e dois episódios da série de TV ‘Queen Sugar’ (2017). Em
1991, ‘Filhas do pó’ foi o primeiro filme dirigido por uma cineasta
negra a ser exibido nos cinemas norte-americanos, e, em 2004, foi escolhido
para ser preservado nos arquivos da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos,
sendo considerado uma obra importante dos pontos de vista histórico, cultural e
estético.
Um
Reino Unido (A United Kingdom, 2016 – Amma Asante) [Inglaterra]
Esta cinebiografia é inspirada na história real de
Seretse Khama, o príncipe herdeiro de Bechuanalândia, atual Botsuana, que,
pouco depois da Segunda Guerra, enquanto estudava na Inglaterra, se apaixonou e
se casou com Ruth Williams, uma garota branca, filha de um pequeno comerciante.
Obviamente, o relacionamento deles é um escândalo, não só por causa da questão
interracial, mas também porque ele deveria voltar ao seu país natal e assumir o
trono. O casamento de Seretse e Ruth cria um problema diplomático que envolve
questões do apartheid da África do Sul, o interesse da Inglaterra em explorar
pedras preciosas em Bechuanalândia e empresas mineradoras americanas
desembarcando no país natal de Seretse. O filme é bem tradicional em
sua narrativa, mas gostei muito dos atores e achei a história interessante
(não fazia ideia dos acontecimentos que levaram à independência de Botsuana). E ainda mostra
a importância das mulheres, mais abertas ao diálogo e à pacificação, na
resistência modesta e na resolução dos conflitos.
Nota:
3,5/5
Amma
Asante é uma roteirista e diretora inglesa que começou a carreira como
atriz na infância. Como diretora, lançou seu primeiro longa, ‘A way of life’,
em 2004, e, desde então já lançou mais três filmes (o mais recente deles, ‘Where
hands touch’, em setembro de 2018), e tem outro em fase de pré-produção.
Além
dos Limites (Love & Basketball, 2000 – Gina Prince-Bythewood) [Estados
Unidos]
Quincy costumava ser o melhor jogador de basquete do
bairro, mas a chegada de Monica o desestabiliza – como ela podia jogar tão bem
sendo menina? Desde a primeira vez que se viram, eles competem nas quadras.
Passam a infância disputando para provar a superioridade, começam a namorar na
universidade, enquanto batalham individualmente por suas carreiras, mas quando
se torna impossível manter o relacionamento sem que isso afete o treino, eles
têm que escolher do que vão abrir mão. À primeira vista, parece mais um filme
da “Sessão da Tarde” que trabalha bem os clichês do romance: casal se conhece,
se detesta, se aproxima, se separa e tem uma segunda chance. Mas nas
entrelinhas há muito mais sendo discutido. Para começar, a comportamento esperado
das mulheres: Monica é constantemente cobrada para ser “mais feminina”, menos
briguenta, enquanto a agressividade é vista como algo positivo nos colegas
masculinos; depois, o valor menor que o trabalho feminino tem (tanto Quincy
quanto Monica fazem parte de times universitários, mas o masculino tem
prestígio, cobertura na mídia, aura de celebridade para os jogadores, a NBA
como objetivo máximo, enquanto o feminino é ignorado, tem pouco investimento e
não tem uma liga de renome na qual as moças possam seguir carreira); o fardo da
maternidade (a mãe de Monica, a mãe de Quincy e uma das jogadoras selecionadas
para a equipe universitária veem seu sonho de ter uma profissão terminar ainda
na adolescência porque engravidam, enquanto seus pares seguem com suas vidas
sendo pouco abaladas). Resumindo, gostei muito mais do filme do que imaginei
que gostaria. E deixo aqui a sugestão para vocês.
Nota:
3,5/5
Gina
Prince-Bythewood é uma roteirista e diretora norte-americana que, logo
após se formar em cinema na UCLA, começou a escrever roteiros para séries de TV.
Como diretora, seu primeiro longa-metragem foi ‘Sem vestígio’, de 2000,
mesmo ano de 'Além dos limites', que foi concebido e produzido durante o
laboratório de escrita e direção de Sundance e abocanhou doze prêmios no total.
Ela também dirigiu 'A vida secreta das abelhas', adaptação do livro de
mesmo nome, lançado no Festival de Cinema de Toronto de 2008.
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Outros filmes com protagonistas negros dirigidos por cineastas negras que já
postei
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