O
livro traz três peças divertidas com um tema em comum: a infidelidade. Na
primeira, um homem marca encontro com a amante para terminar o relacionamento
e, enquanto aguarda a chegada dela, conhece um andarilho esquizofrênico que o
acusa de ter plagiado um trabalho seu; a segunda história envolve um casal de
desconhecidos que chega de bicão em uma reunião familiar e revela a traição de
membros da festa; por fim, uma psicanalista descobre que o marido a traía com
uma de suas pacientes e arma uma sessão de acareação dos envolvidos.
Já
fazia um bom tempo que eu não lia nada do Allen. Daí outro dia eu precisava de
algum livro pocket para ler no metrô e me lembrei de “Adultérios”. Foi um
reencontro lindo, que reafirmou meu amor pelo baixinho neurótico.
A
primeira peça, “Riverside Drive”, eu
já conhecia, pois assisti à encenação alguns anos atrás (falei dela AQUI). Não
sei se o contato prévio com o texto teve alguma influência, mas o fato é que é
minha história preferida entre as três. A cada fala dos personagens eu relembrava os diálogos no palco e, mesmo sabendo o desfecho, me diverti muito
com as loucuras Fred, o sem-teto que chega puxando papo com Jim, que espera a
amante, o acusa de ter roubado sua ideia de roteiro de um blockbuster de
sucesso e acaba se transformando em conselheiro sentimental do outro. De um
jeito intrometido, engraçado e enrolado, Fred se infiltra tanto na vida de Jim
que, mesmo contrariado, o outro se vê dependente do maluco.
Em “Old Saybrook”, o casal Sheila e Norman
é anfitrião de um jantar que conta também com a presença de Jenny, irmã de
Sheila, e seu marido, David. Enquanto Sheila, Norman e Jenny preparam bebidas e
cuidam da churrasqueira, David se tranca no quarto para a um evento de esporte
na TV. Seus únicos interesses são picles e esporte e nada abala sua dedicação a
eles, nem os segredos escabrosos envolvendo sua esposa expostos por um casal de
desconhecidos que pede para dar uma olhadinha na casa a fim de relembrar os
bons momentos que viveram ali. O desfecho foi inesperado e interessante, mas,
como sempre, o grande destaque são as situações improváveis e ao mesmo tempo
totalmente verossímeis criadas por Allen.
Na
terceira e última peça, “Central Park
West”, a psicanalista Phyllis descobre a traição do marido com uma de suas
jovens pacientes e amiga, Carol, e decide lavar a roupa suja em uma sessão de
acareação dos infiéis. A ironia aqui é Phyllis ter se empenhado em ajudar Carol
a levantar a autoestima para conquistar o amado que, na verdade, era seu
próprio marido. E o final também surpreende, com a chegada de mais um casal,
que altera toda a dinâmica da sessão de acusações e afeta o destino dos
personagens de um modo divertido.
Em
todas as histórias, o texto irreverente de Allen é o que torna situações que
poderiam ser retratadas como tragédias cheias de rancor e juras de vingança em
momentos engraçados, quase surreais. Personagens em busca do amor, pessoas
cheias de falhas e inseguranças, diálogos rápidos, respostas afiadas, piadas
que surgem naturalmente... tudo isso marca presença neste livrinho curto e
ideal para momentos de descontração. Um legítimo “Woody Allen”. Mais uma ótima
leitura para minha coleção.
JIM - Preciso
contar a Lola... preciso... é o único jeito.
FRED - É?
JIM - É melhor vindo de mim do que por um estranho mal-intencionado.
FRED - É
mesmo?
JIM - Além
disso, põe um fim à ameaça de chantagem.
FRED - Você
não pode contar a Lola que está tendo um caso há seis meses.
JIM - Por que
não? Se eu levar flores...
FRED - Não há
flores suficientes nem no Jardim Botânico.
JIM - As
pessoas têm casos e depois percebem que erraram.
FRED - Você está
sendo racional demais. A Lola tem tolerância zero para infidelidade. Foi o que
destruiu a infância dela.
JIM - Como você
sabe disso?
FRED - Meu
cachorro me disse.
[Trecho
de 'Riverside Drive']
Para
quem procura uma leitura leve sobre assuntos triviais com uma escrita simples e
envolvente.
3 comentários:
Michelle, preciso de mais Woody Allen na minha vida!
Dele eu li "Sem plumas" e lá tem um texto que amo muito, porque é engraçado, cheio de referências, e genial, mas genial mesmo. É uma paródia com "Cartas a Theo", do Van Gogh - lá ele trata os impressionistas como dentistas. Genial!
beijo grande, Mi
saudade!
Maira
Olha, eu não curto muito peças, mas até fiquei com vontade de conhecer a escrita de Allen. E, gente, que situações são essas? Li cada parágrafo com um sorriso no rosto. Gostei mais da primeira “Riverside Drive”. :D
Bjs ;)
Eu nunca li nada do Allen apesar de já ter trivisto todos os filmes dele :O Que falha de caráter essa minha hahahahaha
Pelo menos agora já sei por onde começar, adorei a resenha ;)
Beijos!!!
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